A fala envolve uma complexa atividade cerebral. Inicialmente, o cérebro transforma um pensamento ou ideia em palavras. Em seguida, essas palavras são convertidas em movimentos precisos dos pulmões, língua e boca para formar os sons. Esses movimentos precisam ser perfeitamente coordenados com a respiração. No entanto, danos cerebrais causados por um acidente vascular cerebral (AVC) ou por doenças neurológicas podem comprometer esse processo, afetando tanto a articulação quanto a conversão do pensamento em fala. 

Por isso, alterações na voz e na fala podem ser os primeiros indícios de uma doença neurodegenerativa. A coleta de amostras vocais para pesquisa pode auxiliar no diagnóstico precoce dessas condições, explica o Dr. Hugo Botha, neurologista comportamental e diretor associado do Programa de Inteligência Artificial de Neurologia da Mayo Clinic, em Rochester, Minnesota. 

“Existem algumas doenças cuja primeira manifestação ocorre na voz ou na fala do paciente”, afirma o Dr. Botha. Entre elas, estão a doença de Parkinson, o parkinsonismo atípico (como a atrofia de múltiplos sistemas, a paralisia supranuclear progressiva e a síndrome corticobasal), a esclerose lateral amiotrófica (ELA), a miastenia grave e alguns tipos de demência frontotemporal que podem levar à afasia. 

Monitoramento clínico e pesquisa 

Na Mayo Clinic, a prática clínica já inclui a gravação da fala de pacientes neurológicos, permitindo o monitoramento da evolução das doenças ao longo do tempo. Paralelamente, a instituição conduz um amplo programa de pesquisa, no qual amostras de voz e fala são coletadas por meio de um aplicativo acessível via celular ou computador. 

“Os pacientes realizam esses exames de forma remota, em intervalos regulares — a cada duas semanas, a cada dois meses — para que possamos obter uma visão longitudinal da progressão da doença, em vez de apenas um registro pontual”, explica o Dr. Botha. 

Inteligência artificial na análise da fala 

Esse banco de dados crescente, que armazena com segurança as amostras coletadas, pode ser utilizado em pesquisas, incluindo o treinamento de algoritmos de inteligência artificial (IA). 

“Há padrões sutis na voz e na fala que um algoritmo pode detectar, mas que um ouvinte humano não perceberia. É nesse ponto que entra a pesquisa com IA: analisamos centenas de gravações de pacientes com diferentes doenças para descobrir se o computador consegue diferenciá-las, mesmo quando essa distinção não é evidente para um ouvinte humano”, conclui o Dr. Botha.