As tecnologias profundas, ou deep tech, estão revolucionando a prevenção, o diagnóstico e o tratamento de doenças como câncer, diabetes e doenças cardiovasculares no Brasil.
Com a aplicação de inteligência artificial (IA), biotecnologia, nanotecnologia, robótica e computação quântica, o setor de saúde está passando por uma transformação significativa. Segundo Diego Aristides, cofundador da Stellula e ex- CTO (Chief Technology Officer) do Hospital Sírio-Libanês, “o deep tech tem um potencial gigantesco porque, através dele, começamos a falar muito mais sobre saúde do que sobre doença”.
O impacto da IA na prevenção e diagnóstico precoce
A IA tem demonstrado um grande potencial na detecção antecipada de doenças, possibilitando tratamentos menos invasivos e aumentando as chances de cura. Um estudo do Instituto Norueguês de Saúde Pública (FHI) revelou que a IA pode identificar o risco de câncer de mama com até seis anos de antecedência.
No Brasil, essa abordagem poderia otimizar os programas de rastreamento do SUS e ampliar o acesso ao diagnóstico precoce. No entanto, Diego alerta para os desafios: “Os principais desafios para a implementação dessa tecnologia envolvem infraestrutura, capacitação profissional e regulação. A falta de equipamentos modernos e digitalizados em algumas regiões limita o uso da IA para análise de imagens, reduzindo seu impacto”.
Exemplos de deep tech no Brasil
Startups brasileiras já estão aplicando deep tech com eficiência em diversas áreas da saúde:
- Diagnóstico por imagem: A IONIC Health desenvolveu um sistema que permite a operação remota de equipamentos de imagem, facilitando o acesso a exames de alta qualidade em regiões sem especialistas.
- Monitoramento de distúrbios neurocognitivos: A ViewMind utiliza óculos de realidade aumentada para identificar sinais precoces de Alzheimer e Parkinson.
- Personalização da medicina: A Munai cruza dados clínicos com IA para auxiliar médicos na prescrição de tratamentos personalizados.
- Análise de exames laboratoriais: A Huna usa IA para acelerar e tornar mais precisos os laudos de exames.
Diego destaca ainda um caso de sucesso no uso da realidade mista na medicina: “Na época em que atuava como CTO do Sírio, realizamos uma cirurgia com dados visualizados em 3D em óculos de realidade mista para remoção de tumor. A informação dos óculos não é apenas ilustrativa, mas fundamental para tornar o procedimento ainda mais minimamente invasivo e com altíssima precisão”.
Barreiras para a adoção de deep tech
Apesar dos avanços, a adoção de deep tech no Brasil enfrenta desafios estruturais. A falta de digitalização e interoperabilidade nos sistemas hospitalares compromete o fluxo de informações e reduz a eficiência das soluções baseadas em IA. Além disso, o investimento em pesquisa e desenvolvimento ainda é limitado, e a burocracia regulatória dificulta a aprovação rápida de novas tecnologias.
Outro obstáculo relevante é a capacitação profissional. Segundo Diego, “muitos médicos e profissionais de saúde ainda não foram treinados para utilizar inteligência artificial e outras tecnologias emergentes, o que pode gerar resistência à sua adoção”. A inclusão de disciplinas de tecnologia nos cursos de graduação em saúde e programas de capacitação contínua podem ajudar a reverter esse cenário.
“Os profissionais de saúde precisarão se adaptar a esse novo cenário, tornando-se AI First Thinkers, ou seja, especialistas que utilizam inteligência artificial e outras tecnologias como ferramentas essenciais na tomada de decisões clínicas. A tecnologia não substituirá os médicos, mas ampliará sua capacidade de diagnóstico, personalização de tratamentos e eficiência no atendimento”, afirma.
Como hospitais podem se preparar para a revolução digital
Para integrar IA e deep tech de forma eficiente, hospitais e clínicas precisam de planejamento estratégico. O primeiro passo é mapear os processos internos e identificar áreas onde a tecnologia pode trazer ganhos imediatos. Pequenos avanços, como a digitalização de prontuários e a adoção de sistemas interoperáveis, já criam uma base para soluções mais avançadas.
Além disso, a capacitação dos profissionais de saúde também se mostra essencial nesta área, sendo usada para reduzir resistência e garantir a adoção bem-sucedida da tecnologia. A colaboração com startups de saúde e instituições de pesquisa também pode facilitar a implementação de soluções inovadoras sem a necessidade de grandes investimentos internos.
Para que essa mudança ocorra de forma estruturada, o especialista afirma que será essencial fortalecer um ecossistema conectado, em que hospitais, healthtechs, empresas de tecnologia, universidades e hubs de inovação trabalhem juntos. “A colaboração entre esses diferentes atores será fundamental para acelerar a adoção da deep tech na saúde e garantir que os benefícios dessas inovações cheguem ao maior número possível de pacientes”, diz.
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Regulação e interoperabilidade: pilares para a IA na saúde
A regulação e a interoperabilidade de sistemas são fundamentais para a expansão segura da IA na saúde. O cofundador da Stellula reforça a importância do Open Health, um modelo que permite a troca padronizada de informações entre diferentes sistemas. “É essencial lembrar que o dado pertence ao paciente, e é necessário fortalecer um ecossistema de troca de informações que seja seguro, transparente e interoperável”, destaca.
A criação de padrões nacionais para interoperabilidade e a adoção de soluções que garantam a privacidade dos pacientes serão decisivas para o avanço da IA na saúde. Além disso, uma esteira regulatória mais ágil permitirá que novas tecnologias sejam testadas e validadas com segurança, garantindo seu impacto positivo na assistência médica.