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Momento de priorizar parcerias entre a fonte pagadora e o serviço de saúde

Article-Momento de priorizar parcerias entre a fonte pagadora e o serviço de saúde

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- Shutterstock

Na última Jornada da Gestão da Saúde, que teve o eixo temático na gestão de negócios em saúde, tive a oportunidade de conviver com dezenas de profissionais que atuam na gestão da saúde, pela primeira vez simultaneamente com algumas salas de turmas de cursos de pós graduação, e reforçar o sentimento do que eles consideram como maiores pontos de atenção "pandêmicos" para sus, operadoras, hospitais, clinicas e SADTs ... e suas carreiras !

O que deu “mais audiência” dá bem a dimensão do que está na agenda dos gestores das operadoras de planos, hospitais, clínicas, SADTs e SUS:

·         A pandemia afeta cada um de forma diferente ... mas muito diferente;

·         Mas nunca todos se sentiram tão dependentes uns dos outros para manter a sustentabilidade, porque a dificuldade de alguns acaba repercutindo na cadeia de valores inteira;

·         E, especialmente no caso da saúde suplementar, jamais os gestores estiveram tão inseguros em relação ao que pode ser o novo normal – o que consideravam dificuldade, hoje até entendem que era a “zona de conforto” que equilibrava as contas.

O momento é de priorizar parcerias entre a fonte pagadora e o serviço de saude

(*) Todos os gráficos são partes integrantes do Estudo Geografia Econômica da Saúde no Brasil – Edição 2020

Vamos começar lembrando que o mercado da saúde foi abandonado desde o início da pandemia pelos governos (federal, estaduais, municipais) que só pensam naquilo que pode dar algum retorno político na próxima eleição – uma piada pronta que já nos acostumamos a ver em ano eleitoral.

Lembrar que o mercado da saúde é composto por uma maioria absoluta de pequenas empresas:

·         Consultórios, clínicas, hospitais, operadoras, distribuidores ... são empresas com baixa capacidade para entender e reagir às condições do mercado;

·         Menos de 6 % do total de hospitais que existem têm mais de 200 leitos – mais de 66 % deles não tem 50 leitos;

·         Menos de 2 % das operadoras têm mais de 43 % de todos os beneficiários da saúde suplementar – a maioria delas (mais de 65 %) são operadoras que não tem 30.000 beneficiários !

Se engana “no atacado” quem, quando pensa em saúde, se lembra das grandes operadoras, dos grandes hospitais e redes de hospitais ... estas empresas não são a regra, são a exceção no mercado.

E lembrar que vivemos em um país de dimensões continentais:

·         Mesmo na região com maior densidade de população com o a Sudeste, o reflexo da crise no norte de Minas é completamente diferente do que acontece na região metropolitana do Rio de Janeiro;

·         É muito diferente o que está acontecendo no Noroeste do Estado de São Paulo, do que está acontecendo no Vale do Ribeira no Estado de São Paulo.

Estar bem preparado para entender como os sistemas de financiamento funcionam, o que os está afetando, e o que se pode fazer para melhorar é questão de sobrevivência !

Do que estamos falando ?

Temos quase 18 milhões de contas de internação por ano no Brasil:

·         Em dois sistemas de financiamento complexos como são o SUS e a Saude Suplementar regulada, geradas por uma maioria de empresas com especialização inadequada para faturar adequadamente, embarcam uma infinidade de erros;

·         Em um volume tão elevado é esperado que haja desperdício, erros e fraudes;

·         Tomo a liberdade de recorrer ao meu longo tempo de experiência na área para afirmar categoricamente que este volume de contas gerado por uma maioria de empresas pequenas e pouco capacitadas para faturar adequadamente cria uma incidência muito maior de erros, do que o nível de desperdício e fraudes cantado em verso em prosa pelos oportunistas.

Sem esquecer que a maioria das contas de internação está no SUS (mais de 14 milhões), e que as estruturas de faturamento dos serviços de saúde públicos são, na média, menos capacitadas e profissionalizadas que as da área privada:

·         Temos um vírus na área pública que se chama turnover: quando um partido da oposição ganha a eleição tudo que era feito antes não presta, afasta-se quem tomava conta de tudo, e coloca-se uma “pessoa de confiança” que vai levar de 4 à 5 anos para entender como se faz, e aí vem a outra eleição e ... começamos tudo do zero novamente !!!

·         É muito fácil entender que temos uma enormidade de erros em contas de internação no SUS – e erros, diferente de fraudes e desperdícios, ocorrem para maior ou para menor;

·         Temos contas erradas cobrando mais do que deveria ser cobrado, mas também temos contas erradas cobrando valores menores.

Então uma preocupação clara das operadoras (abrimos uma turma adicional do tema na jornada por conta disso) é o cada vez maior ressarcimento para o SUS em consequência dos atendimentos dos seus beneficiários na rede pública.

Começou timidamente mas já era esperado que o sistema de cobrança se ajustaria, e que os valores seriam cada vez maiores.

Acontece que estamos presenciando a quebra de muitos serviços de saúde, especialmente os muito pequenos:

·         Eles não existiam por acaso. A maioria das fontes pagadoras não possui rede própria e assim foi criada a demanda para a produção deles;

·         Os contratados pelo SUS de forma contratualizada até foram menos afetados dos que são repassados por produção ... tiveram sorte ... os outros passam pela mesma dificuldade dos que prestam serviço para operadoras;

·         O ponto de atenção para as operadoras, que puderem, passa por equilibrar a destinação da assistência entre sua rede própria e sua rede credenciada para que não fique sem opção quando o mercado começar a voltar ao normal.

Se ficarem sem opção seus beneficiários ficarão desassistidos e passarão a utilizar a rede SUS e as consequências sabemos que poderão ser financeiramente insuportáveis:

·         Multas excessivas aplicadas pela ANS

·         Ressarcimentos excessivos cobrados pelo SUS.

Também vamos lembrar que ressarcimento ao SUS é o “mais odioso” dos custos para as operadoras:

·         São atendimentos não autorizados, não previstos em orçamento e que, na teoria, não podem compor a base de sinistralidade para o período seguinte;

·         Devem ser bem avaliados e recursados porque a estrutura de faturamento das contas no SUS é muito suscetível aos erros !

E na Saúde Suplementar o problema é outro:

·         São menos contas (cerca de 3 milhões), mas ao contrário do SUS quase que 100 % auditadas uma por uma – o mercado de auditoria de contas gira em torno disso, composto por milhares de médicos, enfermeiros, dentistas e outros profissionais que se formaram em profissões assistenciais e acabaram migrando para a “profissão da caneta”;

·         A auditoria que “coloca algum freio” nos custos do sistema, muito comumente aponta os mesmos erros nas contas de um serviço de saúde sistematicamente há anos;

·         Este mercado de auditoria, tão necessário para conter custos, têm seu próprio custo, que as operadoras tentam reduzir trocando as contas apresentadas em formato aberto pelas contas apresentadas em formato de pacote.

Contas apresentadas em forma de pacote financeiramente sempre beneficiam a operadora, mas não são inviáveis para o serviço quando se estabelece uma relação de parceria entre que paga e quem presta o serviço.

Os serviços de saúde devem entender que o momento exige que as operadoras tenham previsibilidade orçamentária ... senão a maioria, que é pequena, vai quebrar:

·         A queda nos custos das operadoras é fato – atendimentos eletivos “estão minguando” ... mas a queda de beneficiários também, e ainda não temos parâmetros para entender exatamente qual será o novo ponto de equilíbrio;

·         Prova disso é que, provavelmente, você nunca recebeu tanta propaganda de planos de saúde – os corretores nunca estiveram tão ávidos em captar clientes;

·         Não será nenhuma catástrofe, se a relação com a operadora for de parceria, o serviço de saúde propor pacotes e estabelecer a condição para reavaliar se continuará viável depois.

Para isso o serviço de saúde deve saber analisar a precificação sob os 3 aspectos básicos:

·         Comparando com o preço médio das contas abertas;

·         Comparando com o custo do procedimento, e aí vale lembrar quando deve usar o custo médio e quando deve calcular o custo unitário;

·         Ponderando as questões comerciais de mercado, que são outros parâmetros completamente diferentes;

·         E jamais esquecerem que pacotes só se viabilizam se a parceria com médicos e fornecedores de alto custo estiver previamente estabelecida.

E, se é uma relação de parceria, as operadoras devem saber desenvolver pacotes que sejam viáveis para cada situação:

·         Não desprezar o fato de que um mesmo pacote não tem a mesma aderência em regiões diferentes, para serviços vinculados a mantenedoras de tipos diferentes;

·         E considerar na proposta a redução dos seus custos internos ... isso pode ser a "bala de prata" para desenrolar a negociação final que está inviabilizando o aceite por parte do prestador.

Operadoras e Serviços de Saúde devem aproveitar a crise para abandonar os discursos demagógicos e se empenhar em desenvolver projetos de remuneração alternativos ao fee for service realmente viáveis.

Mercado em retração obriga a inclusão do tema redução de custos tanto para a fonte pagadora como para os prestadores de serviços – ninguém escapa da recessão que o governo insiste em dizer que é insignificante: estamos em um cenário de guerra.

Parar com os "projetos para inglês ver" e aplicar modelos de remuneração baseada em valor onde realmente funciona:

·         Entender onde e como surgiu o tema e as principais barreiras para implantação é imperativo – a não ser que queira desperdiçar dinheiro, é claro !

·         Não perca tempo com RBV se não for empresa grande, e se não estiver em interlocução com empresa grande ... pequenos não têm estrutura nem mesmo para entender do que se trata, quanto mais para implantar de forma minimamente adequada;

·         Não perca tempo com RBV em redes fragmentadas, onde o diagnóstico acontece em um lugar, a preparação do tratamento em outro, o tratamento em outro e a reabilitação em outro ...  neste cenário RBV é pura demagogia da fonte pagadora para aplicar multas em prestadores de serviço ... assim não funcionou, não funciona e não vai funcionar;

·         E não perca tempo com RBV se for utilizar parâmetros estrangeiros para pagamento por performance – estamos no Brasil, país de terceiro mundo, onde a maioria da população nem sonha em ter ao menos saneamento básico ... a mesma população que “coloca um jaleco” e vai trabalhar em uma UTI. Infelizmente estamos no “país do futuro”: escuto isso desde criança e o futuro nunca chega ... e faz tempo que fui criança !

É hora de aplicar modelos de compartilhamento de riscos onde a RBV não tem chance de dar certo:

·         São milhares de casos de sucesso de MCR na área privada e pública;

·         Neste caso não é discurso ... basta conferir;

·         Pode não acabar com o desperdício, mas é inegável que são modelos que reduzem os custos globais do sistema.

E tudo isso se a parceria não for discurso comercial:

·         Se uma parte forçar a outra a resposta será em forma de elegibilidade e seletividade;

·         A parte que “força a barra” começa a ser prejudicada sem saber – abandona uma guerra e acaba entrando em uma guerrilha, que é muito pior.

A partir do início da pandemia a aceitação do mercado para o gestor comercial que só sabe negociar reajustes de preços das tabelas chegou ao limite. Nunca desenvolver pacotes viáveis e alternativas de remuneração viáveis foi tão importante para a sobrevivência das empresas ... e dele próprio !