faz parte da divisão Informa Markets da Informa PLC

Este site é operado por uma empresa ou empresas de propriedade da Informa PLC e todos os direitos autorais residem com eles. A sede da Informa PLC é 5 Howick Place, Londres SW1P 1WG. Registrado na Inglaterra e no País de Gales. Número 8860726.

Como melhorar a cadeia de cura?

Article-Como melhorar a cadeia de cura?

gestao-de-clinicas-cura-da-doenca-atendimento-humanizado
Aprendi a escrever cedo. Caçula de quatro irmãos sou da época que a mãe era a primeira professora.

Minha mãe sentava conosco, sempre os quatro juntos, logo após o almoço para nos ensinar a ler, escrever, contar histórias e estórias, usando a imaginação a favor do conhecimento.

Lembro que ficava deslumbrada olhando meus irmãos juntarem as letras e formarem palavras  através dessas mesmas palavras contarem seu dia-a-dia, as descobertas da infância e ficava imaginando se eu teria a mesma criatividade e competência.

Até que um dia uni as letras de forma lógica, concatenada, e um brilho tomou conta dos meus olhos por que não era apenas eu que entendia o que queria dizer, mas os outros ao lerem também compartilhariam do que eu havia escrito.

Era um mundo novo que se descortinava! Não tinha vergonha de ler todos os outdoors a caminho da escola. Lia absolutamente tudo a minha frente. Passei a escrever em um diário e lá voltava absolutamente todos os dias para reportar o que me havia acontecido.

E hoje vejo com profundo encantamento, como pessoas algumas não tão novas, ficam ao perceber que estes mesmo mundo novo também a elas se descortina, quando aprender a escrever seu nome. Dizem: tenho minha identidade: já escrevo meu nome!

Não diferente deve ocorrer com o paciente. O prontuário é o seu diário! E o autor desta obra? Cada profissional que dele cuidará e ele próprio o alimentará em algum momento através das informações que transmitirá. Sim, por que é um engano pensar que somente os profissionais da saúde é que têm a responsabilidade de ali anotar. É um equívoco imaginar que devo me entregar nas mãos de médicos, farmacêuticos, enfermeiros e tantos outros profissionais sem que eu mesma me envolva e me comprometa com o meu tratamento.

Não a toa o Governo Federal instituiu a Política Nacional de Segurança do Paciente e um dos pilares é o envolvimento do paciente no seu tratamento e este envolvimento vai desde as informações básicas que devo prestar, tais como, história clínica, história familiar, doenças pregressas, alergias, além das perguntas que devo fazer e o processo de observação, como por exemplo nos medicamentos que me serão administrados – cor, hora, forma de aplicação, dosagem, enfim, não deixar a minha vida, a minha saúde somente nas mãos de profissionais que embora competentes são falíveis, aliás como qualquer um de nós.

Escusar-se de informar a sua vida pregressa de doenças, sintomas – às vezes os mais banais – podem impedir o melhor e mais adequado diagnóstico e por conseguinte o melhor e mais adequado tratamento.

Ao mesmo tempo, não anotar seja manual ou digitalmente, além de ser um desrespeito ao Código de Ética Profissional é um desrespeito, antes de mais nada com o ser humano, aquele que espera e deseja que a sua história de saúde seja contada por quem fará tudo para mantê-la.

Erros médicos acontecem diariamente e continuarão acontecendo, seja por conta de um sistema que não colabora, seja por que médicos, enfermeiros e outros cuidadores da saúde são humanos e falharão, certamente.

O que mudará neste contexto é a melhoria na relação profissional x paciente e deste com a sua própria cura ou a sua busca. Certo também que a atividade do profissional da saúde não é uma atividade de sucesso e sim uma atividade de meio em busca do melhor resultado. E é bom que isto fique claro, por que muitos profissionais da saúde exercem uma medicina de milagres, tornando-se por isso mesmo verdadeiras segundas vítimas.

Lembro-me de algumas situações que ocorreram comigo e que, de alguma forma, ilustram o que foi dito acima.

Meus pais moravam em Manaus, Estado do Amazonas, e até então só existiam meus irmãos. Ao mudarem para São Luis do Maranhão, por força do trabalho de meu pai, minha mãe foi acometida de um forte reumatismo que a manteve na cama por muitos dias, já que não podia sequer levantar. Fui concebida neste interim. O reumatismo a fez tomar remédios com fortes componentes abortivos e ao receber a visita de um médico em casa, este ao olhar para ela e talvez imbuído por uma forte intuição disse-lhe que parasse com os medicamentos por que estava grávida. Minha mãe retrucou afirmando ser impossível já que menstruava regularmente e mesmo assim o médico insistiu e pediu que ela fosse ao consultório para que pudessem verificar com maior precisão. Seja pela insistência, seja pela intuição estou viva e agradeço silenciosamente este médico – que sequer sei o nome, mas que salvou a minha vida.

Aos doze anos fui acometida por uma doença chamada glomerulonefrite e fui internada na Policlínica Infantil localizada no largo de Nazaré, em Belém do Pará. Para minar a doença precisava tomar penicilina de 06 em 06 horas e por absoluta coincidência a medicação chegava logo após os sinos da Basílica de Nazaré soarem. Em uma determinada manhã os sinos tocaram e nada da medicação. Avisei minha mãe que foi procurar pela equipe de enfermagem e logo após a enfermeira entrou no quarto com um medicamento de cor amarela o que difere, em muito, da cor da penicilina. Dei o alarme, minha mãe acreditou, troca efetuada e hoje estou aqui para contar a história.

Talvez sejam esses pequenos sinais que evitem novas ocorrências e aumento da estatística. Observar, perguntar, informar: atos que podem melhorar a cadeia de cura.