A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) está considerando alterar as diretrizes de rastreamento do câncer de mama na saúde suplementar. A proposta sugere a realização de mamografias em mulheres de 50 a 69 anos com frequência bienal, alinhando-se às práticas do Sistema Único de Saúde (SUS). No entanto, a medida tem levantado preocupações entre especialistas e representantes do setor jurídico, que alertam para os riscos de comprometer o diagnóstico precoce e aumentar os custos de tratamentos.
A ANS informa que a Consulta Pública 144 foi aberta para alterar o Programa de Certificação de Boas Práticas em Atenção à Saúde (Resolução Normativa 506), especificamente, no que diz respeito à Certificação de Boas Práticas em Atenção Oncológica – OncoRede. Ainda de acordo com a Agência, a proposta em discussão é uma sugestão para fins de certificação, alinhada à métrica utilizada pelo Instituto Nacional do Câncer/Ministério da Saúde.
“O rastreio do câncer deve ser direcionado às mulheres na faixa etária e periodicidade em que há evidência conclusiva sobre redução da mortalidade por câncer de mama e que o balanço entre benefícios e possíveis danos à saúde dessa prática seja mais favorável. Dessa forma, o rastreamento do câncer de mama deve ser realizado bienalmente com mamografia, em mulheres de 50 a 69 anos (INCA, 2021).”
Para Alessandro Acayaba de Toledo, presidente da Associação Nacional das Administradoras de Benefícios (ANAB), a proposta contraria o papel essencial da saúde suplementar no Brasil. “A saúde suplementar é reconhecida por oferecer atendimento ágil, eficaz e abrangente, especialmente em ações de prevenção de doenças. Essa proposta ignora estudos, dados e jurisprudências que evidenciam a importância do diagnóstico precoce”, afirma Acayaba, especialista em Direito e Saúde.
O presidente da ANAB afirma que a mudança conflita com a Lei do Rol de Procedimentos da ANS. No entanto, a ANS garante que não há nenhuma mudança quanto à cobertura dos planos de saúde. “A proposta não tem relação e não altera a cobertura assistencial garantida pelo Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde, que dá direito ao exame do câncer de mama com mamografia bilateral para mulheres de qualquer idade, conforme indicação médica, e com mamografia digital para mulheres de 40 a 69 anos.”
O processo de certificação, no qual a alteração está sendo proposta, é voluntário, ou seja, não é obrigatório. Para se certificar, a operadora deverá cumprir os requisitos do Manual de Certificação de Boas Práticas em Atenção Oncológica e ser avaliada por uma entidade acreditadora de saúde, escolhida entre as homologadas pela ANS.
A Consulta Pública 144 segue em andamento e os interessados no tema podem enviar contribuições por meio do formulário, disponível no portal da ANS, até esta sexta-feira, 24 de janeiro.
Relevância da mamografia como ferramenta preventiva
A relevância da mamografia como método preventivo tem sido reforçada por leis e iniciativas recentes. Em agosto de 2023, a Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da Câmara dos Deputados aprovou um projeto que autoriza mamografias preventivas sem a necessidade de pedido médico. Além disso, dados da Sandbox Data for Health apontam que intervenções precoces, como a quadrantectomia, têm custos significativamente inferiores aos tratamentos de casos avançados, como a mastectomia. “A tentativa de justificar a redução de exames como economia é falha. Menor frequência desloca os custos para tratamentos mais complexos que poderiam ser evitados com a detecção precoce”, explica o presidente da ANAB.
Dados reforçam impacto do diagnóstico precoce
A opinião de especialistas e instituições médicas converge para o alerta sobre os riscos da proposta. Segundo dados da Femama, 40% dos casos de câncer de mama no Brasil ocorrem em mulheres com menos de 50 anos, e 22% das mortes relacionadas à doença também envolvem essa faixa etária. Atualmente, mesmo com a ampla realização de mamografias, 60% das neoplasias mamárias são diagnosticadas em estágios avançados, segundo a Sociedade Brasileira de Mastologia.