“A qualidade é grátis, mas não é um presente. A baixa qualidade é que custa muito caro.”
Philip Crosby
Ano novo, novos projetos e muitas mudanças. Todo novo ciclo traz consigo novas propostas e inúmeras novas oportunidades. No entanto, será que as mudanças propostas para 2025 – ou aquelas que fizemos no ano passado – são mudanças para melhor?
A palavra kaizen é frequentemente traduzida como melhoria contínua, mas sua tradução é um pouco diferente. Kaizen significa “mudar para melhor” (kai: mudança, zen: melhor). Sua extensão no tempo – a continuidade – traz a ideia de que sempre podemos mudar para melhor, continuamente.
Shigeo Shingo, um dos mais importantes gurus da qualidade e considerado um dos pais do Sistema Toyota de Produção, dizia que só há quatro motivos para a mudança: “facilitar, melhorar, agilizar ou baratear um processo. E nessa ordem de prioridade”. Quando olho para muitos projetos e iniciativas de qualidade ou melhoria dentro de diversas organizações de saúde, raramente consigo enxergar ao menos dois desses quatro motivos.
Muitos projetos têm potencial para melhorar um processo, mas invariavelmente envolvem maior complexidade, custo ou tempo – quando não todas juntas –, uma combinação de soma zero, com impacto por vezes positivos na qualidade, mas negativos no custo global da operação.
Não costumamos considerar isso um bom resultado, pelo menos do ponto de vista lean. E talvez por esse tipo de desempenho que as iniciativas de qualidade não tenham uma boa reputação, levando o desempenho financeiro em conta. Muitos acreditam que qualidade implica em aumentar custos.
Mas se desejamos mudanças que impliquem efetivamente em ganhos de qualidade e ao mesmo tempo tornem os processos mais fáceis, rápidos e baratos, o que precisamos fazer?
Há algumas coisas que precisamos entender sobre como as mudanças acontecem. E algumas outras sobre como melhorar o desempenho dos processos (que ficarão para uma próxima coluna). A relação entre elas é quase que uma correlação perfeita. Elas andam lado a lado. E se uma desempenha mal, a outra vai mal também.
Como as mudanças acontecem?
Há uns 15 anos, os irmãos Dan e Chip Heath (Switch – A Guinada, Ed. Best Seller, 2010) criaram uma analogia muito prática sobre os processos de mudança, com uma pergunta muito simples: como um jovem indiano, que pesa pouco mais que 50 quilos, consegue guiar um elefante pesando algo como três toneladas?
A resposta envolve três comportamentos críticos para que a mudança ocorra: ter um propósito claro do que a mudança significa, ter uma conexão emocional com o problema e facilitar o processo de mudança através de um ambiente propício, que torne mais fácil fazer a coisa certa.
Definir o que a mudança significa envolve ter consciência clara do que precisa ser feito, ser capaz de orientar claramente e entender por que a mudança vale a pena. Isso envolve necessariamente mapear as etapas críticas do processo, seus problemas, gargalos e refletir sobre as mudanças necessárias, detalhando efetivamente as tarefas e os comportamentos esperados para um novo processo e um novo padrão para desempenho. Esse é um processo racional de orientação para um novo destino. Uma boa prática é investigar o que dá certo e entender melhor porque esse processo funciona melhor que outros.
Em seguida, precisamos de uma conexão emocional com o problema. É necessário entender como as pessoas se sentem sobre essa questão e como esse sentimento pode ser usado para alavancar a mudança. Muitas propostas de melhoria dentro de um processo de certificação, por exemplo, podem ser consideradas irrelevantes diante do caos e do ritmo alucinante que um departamento pode estar exposto. Nesse contexto, precisamos escolher mudanças que tenham significado e impacto real, e relevar algumas outras mais sutis para um segundo momento.
Costumamos dizer que é preciso aparar o mato alto antes de podar as floreiras. Precisamos entender também que, muito do que chamamos de resistência, pode ser apenas cansaço, exaustão e pura incredulidade de mais uma mudança que veio para piorar o meu dia.
Estudar o funcionamento dos processos de forma sistemática melhora nossa conexão emocional com os problemas e promove um processo de criação coletiva, de aprendizado em grupo onde todos são capazes de se conectar com os problemas.
“Mudar” e “mudar para melhor” são coisas distintas. Precisamos ter consciência de que uma mudança que signifique mais um formulário, mais um checklist ou mais etapas no meu processo é uma mudança que só atende a um dos quatro requisitos do Dr. Shingo, com poucas chances de sucesso.
Por fim, é preciso criar um ambiente onde fazer a coisa certa é mais fácil. Mudar um ambiente muda um comportamento, pavimenta o caminho para que o sucesso seja o resultado habitual.
O elefante segue o guia porque o caminho dele é o trajeto mais fácil, mais natural. Às vezes é preciso quebrar a mudança em pequenos pedaços, encolhendo as distâncias até o sucesso. Pequenas mudanças assustam menos que as grandes. Novos ambientes – ou novos processos mais naturais – também ajudam no desenvolvimento de novos hábitos. E fazer a coisa certa se tornar um hábito.
Quando um comportamento se torna um hábito, ele é “grátis”, você não precisa se esforçar mais para fazer a coisa certa. E isso é algo contagioso. Quanto mais pessoas se comportando da maneira planejada, maior é a chance de que todos adotem essas práticas.
Esse é um dos temas centrais no desenvolvimento de lideranças capazes de transformar o sistema de saúde, o que chamamos de “arquitetos dos sistemas de saúde”. Sem a consciência de que a mudança envolve um destino, um caminho e uma conexão emocional, ela simplesmente não acontece.