Quando os líderes da Associação Médica Mundial (World Medical Association – WMA) reunirem-se em Fortaleza (CE) na próxima semana (16 a 19 de outubro), eles discutirão questões de importância e relevância para cada médico do mundo todo. Centenas de representantes de associações médicas nacionais debaterão uma pauta que vai da pesquisa em medicina à criminalização da prática médica, da pena de morte à violência contra profissionais da saúde.
Médicos de todo mundo se reúnem para buscar a melhor forma de fornecer e apoiar a excelência em saúde e na assistência às pessoas que confiam a eles seus cuidados. Como Presidente do Conselho da WMA e clínico geral em Melbourne, Austrália, eu sei o quão importante esses debates são para a profissão médica em todo o mundo.
Há alguns anos, a profissão tem estado sob uma crescente pressão por parte de governos em todo o mundo, com a intenção de minar a autonomia médica. Este será um dos principais pontos de discussão na reunião de Fortaleza. Em muitos países ao redor do mundo, médicos vêm enfrentando uma pressão indevida por parte de governos que desejam reduzir o poder da profissão médica.
A recente tentativa do governo turco de desmantelar a autogovernança médica foi contrária a todos os princípios da democracia parlamentar e gerou tentativas semelhantes por governos de muitos outros países. Os políticos parecem determinados a exercer mais controle sobre os médicos e sobre suas associações representativas. Uma das principais razões para isso é que os governos estão procurando cortar investimentos em saúde e desejam abafar a crítica e oposição dos médicos.
A WMA se opõe fortemente a qualquer tentativa de abafar a voz dos médicos, porque no final são os pacientes que sofrerão. Autogovernança profissional é um aspecto crítico para a prestação de cuidados de saúde em todo o mundo. Ela serve para fornecer melhor assistência médica aos pacientes e para melhora da saúde pública em nossas comunidades. É por isto que a WMA a considera como uma questão de suprema importância: médicos são os mais ferrenhos defensores dos pacientes.
Outra questão que tem atraído manchetes deprimentes ao longo dos últimos anos têm sido os frequentes ataques a médicos e centros de medicina em países que sofrem distúrbios civis e militares. Em nenhum lugar isso é mais evidente do que no Oriente Médio e, mais recentemente, na Turquia, onde médicos foram mortos, torturados, espancados e presos por simplesmente cuidar de feridos e de pessoas que estavam morrendo. Líbia, Barhein, Síria e muitos outros países têm sido foco de terríveis ataques a trabalhadores da saúde, hospitais, ambulâncias e outros centros médicos.
A WMA se juntou recentemente ao Comitê Internacional da Cruz Vermelha em um projeto global para identificar a extensão deste problema e sugerir formas para que tais ataques possam ser interrompidos. Todo médico que é morto ou preso e todo hospital que é bombardeado significa interrupção do sistema de saúde e mais sofrimento aos pacientes. Em nossa reunião em Fortaleza, vamos considerar outras medidas que precisam ser tomadas.
Ética médica tem sido foco da WMA desde que a Associação foi criada em 1947. Depois da experiência de práticas médicas antiéticas durante a Segunda Guerra Mundial, a WMA foi criada para garantir a independência dos médicos e para trabalhar pelos mais elevados padrões de comportamento ético e de cuidados pelos médicos, em todos os tempos. A Associação desenvolveu a Declaração de Helsinki como uma afirmação de princípios éticos para a pesquisa médica envolvendo seres humanos, incluindo a pesquisa com material e dados humanos identificáveis.
Isto se tornou um marco da pesquisa médica em todo o mundo e, embora dirigida primariamente aos médicos, é relevante para todos envolvidos em pesquisa médica com seres humanos. Em Fortaleza, os líderes da WMA irão debater revisões propostas para a Declaração que levam em conta mudanças na ciência e na ética médica.
Outras duas questões importantes serão discutidas: doenças não transmissíveis e os determinantes sociais da saúde. A carga global causada por doenças não transmissíveis e seus fatores subjacentes, como uso do tabaco, alimentação não saudável, sedentarismo e uso nocivo do álcool, tornaram-se temas para consideração urgente.
Há algum tempo, a WMA vem argumentando fortemente que para combater esta epidemia é necessário prestar atenção às causas subjacentes envolvidas. Estes são os fatores mais amplos que influenciam o comportamento das pessoas em relação à saúde, juntamente com as condições em que elas nascem, crescem, vivem, trabalham e envelhecem, e a própria influência da sociedade – em outras palavras, os determinantes sociais da saúde. São esses fatores sociais, culturais, ambientais e econômicos que constituem as principais influências na qualidade de vida, na saúde e na extensão da expectativa de vida sem incapacidade.
Entre outras questões a serem debatidas na reunião estão a tendência dos organismos de normatização não médicos em introduzir padrões nos cuidados clínico e médico, a preparação para situações de desastre e a medicina centrada na pessoa. Especialistas experientes, versados e éticos em suas áreas devem conduzir estas discussões e estabelecer padrões: sem burocracia ou dogma político. No centro de todos nossos debates está a necessidade de garantir a segurança do paciente e a qualidade do atendimento como foco da prática médica. Para os pacientes, um elevado nível de desempenho pode ser uma questão de vida ou de morte.
* Mukesh Haikerwal, presidente do conselho da Associação Médica Mundial (WMA)