A 4ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho decidiu, em 11 de outubro, que é possível a prática do regime de trabalho com 12 horas de trabalho seguidas de 36 horas de descanso (12×36), sem que haja prévia autorização do Ministério do Trabalho e Previdência para a prática desse regime compensatório, quando a dispensa dessa licença é negociada com o sindicato. Esse entendimento, ainda minoritário no tribunal e na própria turma, pode vir a solucionar um problema relevante para as entidades que trabalham com prestação de serviços de saúde, notadamente hospitais e clínicas, que precisam dessa jornada para manter a atividade durante todo o dia, em todos os dias da semana. Tais empregadores vêm sendo condenados a pagar uma quantidade expressiva de horas extraordinárias, porque não possuem essa autorização e praticam esse regime por necessidade – tanto deles quanto dos trabalhadores.

A pretensão dos trabalhadores pelo estabelecimento desse regime é histórica. Muitas categorias profissionais preferem trabalhar no sistema 12×36 noturno por várias razões, como o acréscimo salarial e até mesmo a própria segurança, na medida em que se evita o transporte à noite pela cidade. Os profissionais da saúde se enquadram nessa situação. Essas categorias precisam trabalhar à noite, em razão da natureza da atividade. Portanto, embora o regime efetivamente extrapole o limite de jornada constitucional e legalmente previsto de oito horas diárias, traz pontos positivos. Tanto é que o TST o considerou reiteradamente válido, a ponto de editar súmula com o entendimento consolidado nesse sentido.

No entanto, mesmo diante desse reconhecimento, o tribunal considerou inválido o acordo de compensação de jornada em atividade insalubre, ainda que estipulado em norma coletiva, sem a necessária inspeção prévia e permissão da autoridade competente. A partir de então, as entidades que prestam serviços de saúde, cujos empregados, em maioria, trabalham sob condições insalubres, passaram a necessitar dessa autorização. No entanto, o processo de obtenção da licença prévia é dificultoso, principalmente porque os requisitos não são de fácil cumprimento, em especial para as entidades de saúde.

Um exemplo é a inexistência de acidente de trabalho, no período de dois anos, com lesão à saúde que implique em incapacidade por prazo superior a 15 dias. A prestação de serviço de saúde é uma atividade em que ocorrem acidentes de trabalho com alguma frequência. Não se trata de justificativa para não observar normas de saúde e segurança, mas é impossível que não ocorram acidentes de trabalho, por mais que todos os cuidados sejam sempre tomados. No dia a dia de hospitais, o volume de trabalho e a urgência são grandes, e disso decorrem sinistros.

Além disso, até pouco tempo, a portaria anteriormente vigente determinava o indeferimento do pedido de empregadores que apresentarem números elevados de acidentes ou doenças do trabalho. Então, caso alguma entidade hospitalar eventualmente tivesse obtido a licença, poderia perdê-la durante a pandemia de Covid-19 – curiosamente, quando era mais necessário. Ainda que essa portaria tenha sido revogada em novembro de 2021, é razoável imaginar que muitos empregados da área da saúde podem ter contraído a doença ocasionando incapacidade por tempo superior a 15 dias, descumprindo então o já mencionado art. 67 que está em vigor. Frente a esses problemas, as dificuldades para as entidades prestadoras de serviços de saúde se ampliaram, com o consequente aumento de condenações na Justiça do Trabalho e problemas na elaboração das escalas dos profissionais.

A Reforma Trabalhista, porém, excetuou a jornada 12×36 da exigência de licença prévia. Por questões de direito adquirido, as decisões se mantiveram, anulando esses regimes de compensação pela falta de licença prévia. Mas, em pesquisa recente, verificou-se uma possível alteração nessas decisões. Foram localizados 62 julgamentos que entenderam ser necessária a licença prévia – e cinco decisões que consideraram ser desnecessária essa autorização em situações específicas. Embora as últimas sejam minoria, são as mais recentes. Acolhem a alteração na CLT promovida pela reforma, que excepcionalmente autorizou a compensação na modalidade 12×36 sem a licença em questão, e também o decidido no Tema Repetitivo 1046 pelo STF, que julgou constitucionais as normas coletivas que pactuam limitações de direitos trabalhistas por norma coletiva, considerando válidos os regimes de compensação 12×36 sem a autorização do MTE. Quando negociada em norma coletiva, essa exceção pode valer para outros regimes de compensação, como o banco de horas. 

Se o entendimento se consolidar, é possível que as entidades prestadoras de serviços de saúde tenham maior segurança no desenvolvimento das atividades. Não basta só considerar o regime 12×36 válido. Também é preciso que a prática, como de fato ocorre, também seja validada pelo tribunal. Considerá-lo válido, mas impondo excessivos requisitos para o reconhecimento, como efetivamente vem ocorrendo, traz insegurança tanto para os empregadores como para os empregados. Se houver a consolidação, haverá uma mudança salutar nas circunstâncias, promovendo-se um ambiente de segurança jurídica.

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Benôni Canellas Rossi Matheus Lemos

 *Benôni Canellas Rossi e Matheus Lemos são sócios do RMMG Advogados e especialistas em Direito do Trabalho