Entendendo o aumento do ressarcimento das Operadoras de Planos de Saúde ao SUS ao longo do tempo !

Fonte: Geografia Econômica da Saúde no Brasil

Faço uso de fotos dos hospitais de campanha criados durante a crise COVID-19 para ilustrar como é precária a estrutura do SUS para cobrar o ressarcimento das operadoras de planos de saúde correspondente aos beneficiários de planos que são atendidos por ele.

A foto é bem emblemática para profissionais de TI … e para profissionais como eu que resolveram deixar de atuar na TI da saúde indo para a área de negócios (faz tempo hein!), um pouco pela decepção de que não se consegue fazer o que é necessário, e um pouco porque se gasta muito esforço e dinheiro para criar sistemas e aplicativos para solucionar problemas que não existem.

Todas as fotos, de hospitais diferentes, têm uma coisa em comum:

·         Você verá equipamentos médico-hospitalares (respiradores, monitores …), verá um balde para descartar material infectado, verá arsenal para ministração de medicamentos …

·         E não vai ver nenhum computador na beira do leito !!

Se tiver sorte, verá computador na entrada do serviço … se tiver muita sorte, diga-se de passagem !!!

Pouca gente tem a dimensão exata disso, ou vivência para entender por que isso acontece, mas o ponto central é que a medicina tem foco no tratamento do paciente (graças a Deus!):

·         Não tem foco em controles, custos, negócios;

·         Por isso ao definir a necessidade emergencial de um hospital em meio a uma pandemia, prontuário eletrônico, compor AIHs, BPAs, APACs … são coisas que você vai encontrar lá no final da lista do planejamento da abertura do hospital … se tiver sorte de encontrar lá também;

·         E se você estivesse ali na frente de batalha para disponibilizar leitos urgentemente para não deixar paciente morrer na porta dos hospitais que existem, tenho certeza absoluta de que faria exatamente a mesma coisa … quando entrei no segmento não achava … hoje tenho absoluta certeza.

Veja que exemplo macabro:

·         O Estado de São Paulo implantou o mesmo sistema em mais de 40 hospitais da administração direta … a mesma empresa do governo implantou em todos eles … mas eles  não se conversam;

·         Não foi prioridade integrar os prontuários dos pacientes destes hospitais com o sistema dos novos hospitais de campanha;

·         E o médico que atende um paciente COVID-19 em um dos hospitais de campanha do governo não consegue consultar o prontuário do paciente que já passou pelos outros hospitais do Estado … a vida do paciente para o médico ali começa do zero … o médico não consegue consultar se aquele paciente tem doenças preexistentes que o insere no grupo de maior risco … dá pra acreditar ?

(*) todos os gráficos são partes integrantes do Estudo Geografia Econômica da Saúde no Brasil – Edição 2020

Mesmo assim o SUS está aos poucos melhorando seu sistema para cobrar o ressarcimento das operadoras:

·         O primeiro gráfico ilustra o ticket médio dos ressarcimentos de internações. O valor médio anual em torno de R$ 2.150,00;

·         O segundo o ticket médio dos ressarcimentos de atendimentos ambulatoriais – algo em torno de R$ 1.170,00.

O primeiro sinaliza como as operadoras ainda se beneficiam do descontrole do SUS:

·         Além de ser um valor muito baixo para internação, ainda não apresenta evolução nos últimos anos;

·         Para sorte delas o SUS fatura muito mal as internações onde as contas são mais complexas que as ambulatoriais, como ocorre na saúde suplementar, também diga-se de passagem.

O gráfico ilustra o valor médio de ressarcimento de 2 procedimentos:

·         Para parto normal, R$ 849,49 e para parto cesariano, R$ 1.094,49;

·         Se o pior castigo que a operadora tem pelo fato da beneficiária do plano de saúde ter feito o parto na rede SUS é pagar este valor de ressarcimento, “vamos combinar que não é castigo … é prêmio” … “um baita prêmio” !

A figura ilustra o valor dos partos na tabela de preços do SUS:

·         Comparando com o gráfico anterior os leigos podem pensar que o SUS está roubando as operadoras, uma vez que o valor médio do ressarcimento é maior;

·         Mas quem conhece a dinâmica de faturamento SUS sabe que estes valores sinalizam que aquelas médias são pequenas.

Ao contrário do que a maioria das pessoas pensam o SUS não paga seus procedimentos como se fossem pacotes:

·         A tabela de preços do SUS tem 8 grupos, e estes valores do gráfico são apenas os do procedimento parto;

·         A figura ilustra, por exemplo, que as diárias em UTI (grupo 8 da tabela) podem ser lançadas em complemento ao procedimento;

·         Tem diária de acompanhante, ajuda de custo para acompanhante, incentivo ao parto, incentivo ao registro civil, medicamento de alto custo, exame de média e alta complexidade, tratamento de complicações no puerpério … por isso aqueles valores médios são pequenos !!!

Como o ressarcimento das operadoras ao SUS vão para o FNS e não para o serviço que realizou o serviço, e como a maior parte dos serviços recebe por orçamento contratualizado, o cenário não motiva o serviço de saúde a “correr atrás de um dinheiro que vai cair nas mãos sei lá de quem”.

É um cenário “bizarro”: o SUS fatura mal, e as operadoras não conhecem adequadamente as regras para aferir como estão sendo cobradas:

·         Como estamos falando em valores médios, no geral o cenário favorece as operadoras;

·         Mas individualmente operadoras pagam pela média alta procedimentos que foram realizados consumindo menos do que a média, ou seja, se você não conhece a regra para aferir, pode estar perdendo muito !

Mas apesar “da falta de TI”, devagar o SUS vai melhorando seus controles:

·         Nos atendimentos ambulatoriais as operadoras já estão sentindo. São várias as que consultam sobre o tema;

·         Em 2020 mesmo nestes hospitais de campanha “sem computadores”, o esforço para cobrar ressarcimento das operadoras de um atendimento que consome mais de 10 diárias de UTI será grande … não se engane … a conta vai chegar;

·         As empresas que conhecem bem as regras tendem a perder menos, porque as contas podem chegar cheias de vieses.

Conhecer a dinâmica do faturamento SUS interessa para operadoras, fornecedores de insumos do segmento da saúde e serviços de saúde … independente da questão do ressarcimento, conhecer a tabela, os mutirões, os incrementos … pode ser uma excelente oportunidade de negócios para qualquer empresa privada que atua no segmento da saúde.