Produzir internamente um sistema de gestão e ter controle total da ferramenta pode ser uma tentação para uma instituição de saúde. E pode ser também uma tentação para um profissional de TI o projeto de se desafiar a atender às demandas da instituição a partir de uma solução que se encaixe exatamente naquele contexto, gerando até alguma economia. Mas quem cede a esta tentação pode estar negligenciando o histórico de desenvolvimento e pesquisa que grandes fornecedores colocam à disposição do mercado em produtos que nem sempre custam muito mais aos laboratórios e hospitais do que o planejamento, desenvolvimento e implantação de uma solução caseira. Além disso, pode estar também deixando de lado a noção de que o desenvolvimento de sistemas envolve custos indiretos que podem, por vezes, superar os de um produto de mercado. A realidade do uso de sistemas de gestão no País atualmente divide hospitais e laboratórios de operadoras de saúde, no que se refere ao desenvolvimento das soluções. Em sua maioria, hospitais e laboratórios normalmente optam por soluções prontas, em função da complexidade de gestão de seus negócios; e operadoras e empresas de homecare desenvolvem mais. ?O hospital tem uma situação tão complexa, que não seria viável produzir internamente módulos como o clínico, de farmácia, de hotelaria e de prontuário eletrônico?, afirma Elio Boccia, presidente da Kalendae, consultoria brasileira especializada em gerenciamento de serviços de TI. ?O hospital é um negócio de capital intensivo, com altos investimentos em equipamentos e infraestrutura, então não é um negócio que trabalha com margens muito grandes.? Boccia, que já foi diretor de TI da Medial, além de atuar na direção de empresas como Unibanco e IBM, afirma que, no contexto dos hospitais, os softwares precisam atender a três condições: hotelaria, controle de ativos e salas e backoffice (gerenciamento administrativo da instituição). E a isso, segundo ele, têm se somado módulos de controle de farmácia e clínicos compatíveis com prontuário eletrônico. ?Atualmente existem softwares sofisticadíssimos, principalmente na questão de imagens (PACS ? Picture Capture & Communication Systems), que se fossem feitos internamente, além de não atingirem os mesmo resultados, trariam custos maiores que os de um produto fechado?, explica Boccia. ?É uma visão meio míope que faz parecer que o custo do desenvolvimento seja menor, porque às vezes a instituição não tem a visão do custo total que ele tem na mão.? O desenvolvimento dentro da realidade complexa que é a administração de um hospital, na grande maioria dos casos, se atém a aplicativos que vão dar características de personalização a soluções prontas de mercado. O diretor comercial de saúde suplementar do Incor e CEO da Escept, Enio Salu, afirma que, os hospitais buscam algo estável que atenda sua demanda. ?Usam um sistema padrão de mercado e penduram nele uma série de aplicativos, alguns próprios?, completa Salu. Mesmo para hospitais que emergem de uma situação onde não há sequer computadores, as soluções de gerenciamento prontas, de mercado, podem atender plenamente e com algum nível de customização. Um exemplo é o do Hospital de Clínicas Dr. Radamés Nardini, no município de Mauá, na Grande São Paulo, que saiu da escuridão há um ano e meio, quando substituiu o gerenciamento feito em fichas de papel por uma solução adquirida da MV. Mesmo sem precisar o investimento total, o hospital adquiriu uma solução que gerencia todos os processos e compõe a primeira fase da modernização do sistema de gestão do hospital, que partiu do zero e hoje tem cerca de 100 computadores. ?As necessidades da instituição são plenamente atendidas pelo sistema?, afirma o holandês Wilhelm Vernooij, gerente de TI do hospital. ?Agora, temos uma rede estruturada, com um datacenter moderno e estamos entrando na segunda parte da implementação provida pela MV.? Laboratórios O segmento de laboratórios, por sua vez, ainda tem pontos de melhoria, segundo Elio Boccia. Ele afirma que a avaliação de mercado dos pacotes que atendem aos laboratórios ? que assim como os hospitais são supridos na imensa maioria por produtos de grandes fabricantes ? é de que eles não são o supra-sumo dos sistemas de gestão, mas atendem o operacional do laboratório. Em relação a sistemas caseiros, Boccia afirma que existem apenas alguns grandes laboratórios que optaram pela solução própria. No geral, a principal questão em relação ao desenvolvimento de sistemas caseiros está na definição de prioridades dentro de uma instituição. Ao passo que uma empresa do segmento de saúde pode se aproximar da excelência na personalização de um sistema de gerenciamento, ela despende energia e recursos que poderiam ser direcionados para o core do negócio. O consultor da Kalendae explica que a questão muitas vezes está na definição do foco da empresa. ?O executivo de um hospital ou o investidor, às vezes, faz uma linha de raciocínio complicada de que um sistema vai ser o fator para diferenciá-lo no mercado?, afirma Baccio. ?Quando eu acho que um hospital não se diferencia pelo seu sistema, mas pela sua qualidade clínica, de hotelaria, por exemplo. O sistema ajuda isso, mas não faz com que ele se diferencie.? Operadoras O mundo diferente no mercado de saúde é o segmento das operadoras de planos de saúde. Ao contrário dos hospitais, laboratórios e empresas de Homecare, as principais operadoras brasileiras usam sistemas próprios. O cenário de consolidação pelo qual passam as grandes operadoras no País é o que talvez afaste as ofertas de pacotes de sistemas de gerenciamento, segundo Baccio, uma vez que o volume de clientes no mercado deixa de ser interessante para os fabricantes. Algumas tentativas de atender o segmento com pacotes já foram feitas, sem sucesso, em meados de 2006. E o mercado não aponta para uma mudança. ?Muitas vezes uma mudança de sistema fica mais caro do que mantê-lo mesmo sendo próprio?, explica Baccio. Com um investimento anual médio de R$ 500 mil, a operadora cearense, que atua também em 11 estados brasileiros, HapVida Saúde, mantém há 14 anos seu sistema próprio de gestão. A rede atende atualmente a 20 unidades hospitalares, 12 PAs (pronto-atendimentos), 55 postos de coletas de exames laboratoriais e mais 54 unidades de diagnóstico por imagem; todos próprios. Mesmo tendo enfrentado a dificuldade de inserir todos os médicos no uso completo da ferramenta, o superintendente de TI da rede, Taciso Machado, acredita que esta dificuldade seja inercial e que com o tempo o ferramental como um todo passa a ser indispensável para todos os profissionais. ?A grande vantagem do uso de sistema próprio é a personalização?, afirma Machado. ?O nosso, por exemplo, tem características próprias nos módulos de atendimento, PEP (prontuário eletrônico do paciente) e comunicação com a Operadora de Plano de Saúde do Grupo.? Segundo Machado, uma característica importante também, advinda desta personalização, é o nível de auto-atendimento a que se chegou com o sistema. A rede dispõe de tótens de autoatendimento, onde os clientes não precisam de recepcionistas para iniciar o seu atendimento médico ou de serviços hospitalares. Tudo é feito automaticamente após a identificação Biométrica do cliente. A questão das demandas de alta tecnologia para a realização de alguns procedimentos, a HapVida resolveu com a terceirização dos módulos de
PACS, o Aurora, da empresa Pixeon e também o módulo de IP-LIS (Sistema de Informações Laboratoriais sobre IP, em tradução livre, da sigla em inglês), da ND Informática. Machado acredita que o porte das instituições seja decisivo para a definição entre um sistema próprio e um produto de mercado. ?Talvez, em uma instituição com apenas uma ou duas unidades pequenas a relação custo-benefício não seja favorável para se ter sistema próprio?, pondera. *Você está participando do Referências da Saúde? Ainda não? Para entrar no estudo que engloba todos os players do setor, basta enviar e-mail para: [email protected]
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