Estamos vislumbrando que nas próximas eleições a saúde será o tema de maior destaque, e não é para menos: é o pior serviço que a população ?se vê obrigada a engolir?, e sem muita perspectiva de mudança.
Nem a telefonia que nos irrita com um preço muito alto é tão ruim, porque conseguimos falar com as pessoas, mandar mensagens, navegar na internet … mas em saúde:
- Pagamos caro (em impostos) pelo SUS e não conseguimos ser atendidos;
- Pagamos caro na saúde suplementar e para sermos atendidos quando mais necessitamos, temos que pagar algo ?por fora?.
O problema da segurança pública é grave, mas os efeitos da marginalidade afeta efetivamente apenas parte da população … em saúde o problema afeta toda a população.
A falta de perspectiva de melhoria é evidente porque o assunto é tratado com base em factoides, sem a profundidade que a seriedade do assunto requer, e por pessoas que dão opiniões absurdas para resolver problemas sem qualquer discernimento para análise.
Como agravante o poder público está se aparelhando de forma inadequada e agravando o cenário.
Por exemplo: o último concurso de provimento para cargo de especialista em regulação da ANS tinha mais de 100 questões, a maioria de direito, lógica e língua portuguesa, e não tinha uma única questão sobre o Rol da ANS, sobre atenção primária, secundária e terciária em saúde, sobre tipo de atendimento em saúde … nada que exija que o candidato realmente conheça ou esteja atuando no segmento da saúde:
- É evidente que os cargos serão providos por ?profissionais de concurso? que se preparam em cursos de direito constitucional, direito civil, direito administrativo, etc., ou seja, a chance dos especialistas em regulação serem advogados é muito grande;
- Nada contra advogados assumirem as vagas, mas seria muito melhor para a saúde se as vagas fossem ocupadas por pessoas que conhecem o segmento (advogados ou não) e, preferencialmente, que atuam no segmento que terão a responsabilidade de ajudar a regular !
Outro exemplo: nas últimas semanas vimos diversos políticos formados em engenharia, economia, administração e direito opinando na mídia sobre a carreira de médicos:
- Quem trabalha em hospital fica indignado ao ver a absoluta falta de desconhecimento que eles têm sobre o assunto. Eles não se dispõem a discutir o assunto abertamente com médicos, e se limitam a dar entrevistas, fugindo de debates com os interessados;
- E, pior, polarizam o problema da saúde falando sobre médicos. Ignoram que o maior contingente de profissionais da saúde não é formado por médicos: enfermagem, nutrição, fisioterapia, assistência social, psicologia, administradores e técnicos especializados em saúde, e uma infinidade de profissões existentes em serviços de saúde e provedores … ou seja, rotulam o problema da saúde como sendo de uma classe que representa algo em torno de 10 % do total de profissionais da área.
É evidente que todos os problemas da sociedade brasileira são decorrentes da péssima estrutura de educação do país:
- Mas desde quando alguém que não atua na área acadêmica pode saber o que é melhor e o que é viável na formação de um bacharel em alguma coisa ?
- Quem pode opinar sobre isso são os professores e coordenadores dos cursos de graduação, e mais ninguém.
É bom que o foco da discussão das próximas eleições seja saúde, mas resta torcer para que a discussão seja séria, para que seja proveitosa:
- Estamos cansados de ouvir políticos dizendo que vão inaugurar novos hospitais e unidades básicas de saúde. Queremos ouvir o que vão fazer para que os que existem funcionem direito, porque no cenário atual o novo hospital de hoje é apenas mais um péssimo hospital do ano que vem;
- Estamos cansados de ouvir políticos dizendo que vão contratar mais médicos. Queremos ouvir o que vão fazer para valorizar os médicos e os demais profissionais que trabalham no setor de modo que se motivem a produzir mais. Porque da forma como são remunerados e motivados os profissionais do segmento, o novo contratado hoje é apenas mais um passivo trabalhista no ano que vem.
Queremos ouvir políticos apresentando propostas consistentes:
- De melhoria da prevenção, por exemplo redefinindo a abrangência da vacinação pública. É um absurdo continuar vacinando contra a gripe, por exemplo, apenas parte da população;
- De redução do uso da saúde suplementar, ou seja, de melhoria do SUS ? ninguém paga plano de saúde porque gosta, paga porque necessita;
- De programas sociais para melhoria da qualidade de vida, que reduzem a incidência de doenças na população.
Em resumo, queremos ouvir políticos que não são do segmento bem assessorados, por quem realmente ‘é do ramo’.
Vamos torcer para que a crise da saúde transforme as discussões das próximas eleições de ?limão em limonada? !