A pesquisa clínica é um empreendimento de interesse nacional e responsabilidade de pacientes, comunidade médica e científica, governo, empresas e entidades de pesquisa. Embora tenha características propícias para figurar entre os principais centros mundiais nesta área, o Brasil vem perdendo posições no ranking global há duas décadas, devido à ineficiência de seu sistema regulatório. Para reverter esse quadro desfavorável, um grupo de especialistas e de organizações envolvidas com o tema criou um movimento marcante na história da pesquisa clínica nacional, a Aliança Pesquisa Clínica Brasil – Juntos pela ética, saúde e inovação.
A iniciativa vem crescendo a cada dia e já conta com a adesão de mais de 30 associações de pacientes, centros de pesquisa e demais organizações responsáveis pela condução de projetos de pesquisa clínica, além de dezenas de profissionais. A Aliança também visa conscientizar e engajar toda a sociedade sobre a importância dos estudos clínicos para a saúde pública, mostrando seu impacto significativo na melhoria da qualidade de vida dos milhares de pacientes sujeitos de pesquisa e da produtividade científica do país.
Segundo o bioquímico Vítor Harada, representante do comitê gestor da Aliança, o acesso a tratamentos de ponta por pacientes e pesquisadores nacionais é uma consequência direta de um sistema regulatório eficiente e ágil. “Pretendemos estabelecer uma agenda com o governo federal para debater medidas necessárias como a descentralização do poder decisório sobre as análises, a uniformidade das normas legais, a comunicação eficaz entre governo e pesquisadores, o cumprimento de prazos e a agilidade dos serviços alfandegários”, explica. Representantes da Aliança estiveram este ano em audiências públicas no Senado e na Câmara Municipal de São Paulo para debater o assunto e integram o grupo de trabalho criado no Ministério da Saúde, com a participação dos órgãos regulatórios e de especialistas, e que deve emitir um relatório com propostas até o final deste mês de maio.
LENTIDÃO – Enquanto um protocolo de pesquisa é avaliado entre 30 e 90 dias em países como Coreia do Sul, EUA, Austrália, Canadá e alguns da União Europeia, processo similar demora entre 12 e 15 meses no Brasil. Essa lentidão freia o desenvolvimento da ciência nacional de várias maneiras, principalmente porque diminui o interesse da indústria farmacêutica em incluir o Brasil nos estudos multicêntricos, que acabam sendo realizados sem referências do biotipo da população brasileira para a produção de novos medicamentos e tratamentos.
Assim, enquanto representa a sétima economia mundial e o sexto maior mercado farmacêutico, o Brasil ocupa a 15º posição no ranking mundial de registros de pesquisas clínicas, distante dos líderes Estados Unidos, Canadá, Alemanha, França e Reino Unido e atrás de países de menor porte econômico como Bélgica, Dinamarca e Israel. Ocupa o 64º posto no Índice de Inovação Global, atrás de países como Luxemburgo (12º), Estônia (25º), Costa Rica (39º), Chile (46º) e Uruguai (52º). Em 2012, segundo a Organização Mundial da Propriedade Intelectual, o Brasil foi o 24º maior depositário de patentes, com 587 registros, bem atrás dos líderes Estados Unidos (51.207 registros), Japão (43.660), Alemanha (18.855), China (18.627) e Coreia do Sul (11.848).
“A Aliança já conta com o apoio de mais de 30 entidades ligadas à pesquisa clínica e dezenas de profissionais. Acreditamos em uma adesão massiva, pois são diversos os setores da sociedade que se sentem prejudicados pela lentidão da atual regulação. O Brasil está perdendo competitividade e não aproveitando seu imenso potencial de produção de conhecimento e inovação”, completa Harada, que também é farmacêutico com mais de 15 de anos de experiência no setor de pesquisas clínicas.
Segundo Sérgio Nishioka , coordenador-geral de Pesquisa Clínica do Departamento de Ciência e Tecnologia do Ministério da Saúde, apesar de algumas iniciativas para melhorar a avaliação dos estudos clínicos, como o uso de força-tarefa para reduzir projetos em fila de espera, o sistema Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) / Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) / Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) ainda funciona de maneira centralizada e não atende o volume de submissões de pesquisas.
“A Aliança é uma iniciativa oportuna para aprofundar o debate com os órgãos regulatórios e acho importante conhecermos de perto a realidade de pesquisadores e pacientes que estão perdendo oportunidades de participar de estudos clínicos de ponta, liderados pelo Brasil ou por outros países”, comentou o gestor público.