Avaro Esper gostaria de ser um guru do novo posicionamento das empresas de saúde em relação ao uso de papel. O diretor da Estec, empresa que presta consultoria e desenvolve sistemas para gestão eletrônica de documentos, gostaria de poder prever o dia em que o ecossistema de saúde deixará de depender de fichas, vias e duplicatas em papel, tão dispendiosas e na contramão dos rumos que a tecnologia da informação aponta.
Mas Esper acredita que ainda levará algum tempo para que as pessoas se acostumem com isso, e a partir do momento que se acostumarem, a lei se fará pelo uso. De fato, o caminho das inovações tecnológicas segue algumas etapas e assim passam de novidade a moda, em seguida tornam-se práticas para então serem adotadas como padrão por segmentos ou por uma sociedade como um todo. Não deve ser diferente com o que o mercado vem chamando de hospitais paperless (em tradução livre, hospitais sem papel).
“Num atendimento médico, você assina um documento dizendo que você é responsável pelo pagamento de todos os procedimentos, mesmo você tendo plano de saúde, existe um termo e aquilo é papel. “Juridicamente você tem que ter um documento. Então falta ainda um pouquinho para deslanchar esta parte eletrônica”, afirma Esper.
Muito se fala em procedimentos eletrônicos e num trânsito digital de informações cada vez mais abrangente. Por outro lado, a legislação do País ainda está ancorada em papéis. O desafio dos hospitais sem papel, muito mais que um desafio com vistas a uma atuação ambientalmente responsável apenas, é estar diante de toda uma cadeia que se baseia em documentos físicos.
Um sinal positivo nesta direção, segundo Esper, é que já existe jurisprudência, principalmente no sul do País, para o uso de prontuários digitais na constituição de processos jurídicos. Além disso, a lei brasileira ampara há bastante tempo o uso do microfilme, por exemplo. Mas isso não elimina a figura do cartório, onde os microfilmes têm que ser registrados.
“Existem trâmites tanto na Câmara quanto no Senado para tentar legalizar este processo da digitalização com certificado digital, para poder excluir o papel, mas isso é política”, explica Esper. “A gente representa um software norte-americano e até há pouco tempo nós precisávamos mandar um fax para ele para formalizar os pedidos. Então eu acho que para que as coisas sejam cem por cento sem papel ainda vai demorar um bom tempo.”
No início do ano, a Estec desenvolveu uma solução de gestão de documento baseada em computação em nuvem voltada às pequenas e médias empresas do setor de saúde.
Do ponto de vista técnico, já existem sistemas, procedimentos e equipamentos capazes de transformar uma operação comum em uma operação paperless. Por outro lado, a dependência da integração com o contexto mantém as decisões a este respeito bastante ligadas às decisões governamentais.
O gerente executivo de TI do Hospital Samaritano, Klaiton Luís Simão é categórico ao corroborar a ideia de que hoje já existem recursos tecnológicos e soluções que permitiriam a um hospital trabalhar cem por cento sem papel.
“Do ponto de vista técnico isso já poderia ser uma realidade hoje. Mas isso não é uma realidade ainda por causa do ambiente de negócios”, afirma Simão.
Simão liderou a implantação da certificação digital do sistema de prontuário eletrônico do Hospital Samaritano e com isso conseguiu que todos os funcionários que antes imprimiam o prontuário para assiná-lo, não precisem mais fazer isso. O que representou uma economia mensal de 500 mil cópias em papel. No outro prato da balança está o setor de controladoria e de gestão administrativo-financeira do hospital, onde este procedimento não é possível.
“As fontes pagadoras, que são as operadoras de saúde e uma série de órgãos do governo ainda exigem o papel. No universo da organização, é possível trabalhar sem papel, mas como o universo da saúde como um todo ainda não tem esta cultura, a organização ainda faz uso do papel para poder faturar, prestar contas, por exemplo”, explica Simão.
Certificação digital
No início de 2009, o Hospital Samaritano implantou seu sistema de Prontuário eletrônico do Paciente (PEP) com a ferramenta Tasy. Contudo, o ambiente eletrônico ainda demandava a impressão das vias a serem assinadas pelos médicos, uma vez que a ferramenta ainda não estava integrada com alguma solução de certificação digital.
O paradoxo da implantação do prontuário eletrônico com o alto consumo de papel veio à tona para a equipe de TI do hospital que, em maio deste ano finalizou a implementação da certificação digital. O projeto, realizado pela Certsign, empresa especializada no desenvolvimento de soluções de certificação digital, em parceria com a E-Val Tecnologia, consumiu um investimento de R$ 400 mil, para 1,7 mil licenças de usuário, além das licenças de uso do software. O hospital espera o retorno deste investimento apenas com a economia de papéis em até dois anos.
“Fica absolutamente inviável usar a ferramenta eletrônica para prescrever, sem o recurso da certificação digital”, afirma Simão.
A ideia da certificação digital é dar garantia jurídica a documentos eletrônicos. Isso oferece ganhos em segurança para médicos e pacientes, uma vez que a otimização do processo tem vistas a garantir a integridade da informação, bem como dos procedimentos realizados. A assinatura digital aliada ao prontuário eletrônico reduz drasticamente, por exemplo, o atendimento médico feito por profissionais não autorizados.
E o futuro deste ambiente onde os documentos não são mais perecíveis, as informações são confiáveis e a recuperação de dados dos pacientes é integrada e online, é uma classificação cada vez mais minuciosa e amigável para os profissionais da saúde.
Um exemplo deste esforço é o do Complexo hospitalar Edmundo Vasconcelos, de São Paulo, que investiu R$ 2,3 milhões na digitalização dos prontuários dos pacientes ativos de mais de 60 anos de existência da instituição. O hospital, que atende cerca de 1,2 mil pacientes por dia, acredita que o procedimento garante a segurança e a organização das informações.
Mas além disso, o gerente executivo de TI do hospital, Osmar Antonio dos Santos, vê que o principal ganho do investimento é em relação ao acesso. O executivo reforça que o prontuário é um documento que demanda acesso e, muitas vezes depende da agilidade na localização.
O processo de digitalização foi um dos passos para a consolidação da automação dos processos da instituição, que consumiu R$ 10 milhões em investimentos nos últimos três anos.
“Eu acredito que nós vamos continuar recebendo mais demandas dos usuários destes prontuários para inserir cada vez mais inteligência nestes materiais”, afirma Santos. “Por exemplo a integração com sistemas que permitam comentários nos documentos ou mesmo a busca por palavras chave ou por partes dos documentos digitalizados.”
Atualmente, o hospital tem à disposição cerca de 2 milhões de prontuários online.
Veja entrevista com o diretor comercial da de soluções corporativas da Certisign, Decio Tomaz
FH: Como a certificação digital tem contribuído para a redução do uso de papel nos hospitais?
Decio:
Com a implementação do prontuário eletrônico do paciente, o volume de impressão pode aumentar em até 8 vezes. Com a certificação digital, a necessidade de impressão desaparece, agregando os ganhos de segurança (não existe mais empréstimo do carimbo) e integridade da informação.
FH: Qual é a expectativa de que o uso da certificação digital se torne mais aderente a uma quantidade maior de processos para que o ecossistema da saúde também usufrua destes benefícios?
Decio:
O principal processo e um dos mais importantes é o Prontuário Eletrônico do Paciente (PEP), pois ele é a entrada de informação para tudo que o ocorre com o paciente: (farmácia, enfermagem, médicos, faturamento e etc). Mas uma vez, a cultura da certificação digital adquirida pode-se se estender para o TISS, assinatura de contratos, processos de aprovação interna, medições com fornecedores, RH e assim por diante. Em resumo, tudo que é assinado por próprio punho tem potencial para ser assinado digitalmente;
FH: Quais são os principais investimentos a serem feitos para isso?
Decio:
Sem dúvida deve ser caracterizado como um projeto, pois envolve formadores de opinião multidisciplinares (médicos, TI, advogados e etc). Mas também deve-se investir em treinamento, adaptação de sistemas e os certificados para cada pessoa. Mas o retorno é garantido, como, por exemplo, o nosso CASE da TELEFONICA que reduziu 2.500.000 de folhas por ano e aumentou significativamente a produtividade da área de fiscalização;
FH: Qual é o balanço da maturidade do Brasil no uso da certificação digital para a otimização de processos? E qual setor da economia está mais avançado neste sentido?
Decio:
O setor público, em especial o FISCO e JUSTIÇA, seguidos pelos BANCOS, são os maiores usuários da certificação digital no Brasil. A Certisign tem trabalhado para mostrar para a sociedade como um todo, que ela pode ser beneficiar da certificação digital da mesma forma que os segmentos citados acima. Ainda existe muito espaço para desmaterialização de processos com uso da assinatura digital.
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