Baumann (2006) comenta que os médicos devem se dar conta que a remuneração baseada na performance já não é mais uma questão de quando ou se ocorrerá, mas de quando ocorrerá. Isso já é um fato nos países de primeiro mundo. Na Inglaterra,  25% do ganho dos médicos generalistas do NHS advém de incentivos baseado na sua performance medidas por mais de 140 indicadores de qualidade (Rowe, 2006). Nos Estados Unidos, mais das metades dos planos de saúde tem programas com contratos baseados no desempenho dos médicos (Rosenthal, 2006).

No Brasil, algumas UNIMEDs têm adotado o que chamam de “consulta bonificada” onde valores são adicionados ao honorário da consulta para os médicos que não excedam os exames solicitados ou ainda não tenha o custo médio gerado a partir de sua consulta acima de um limite tolerável para a especialidade.

Por melhor intencionados que os gestores estejam quando decidem implantar modelos de pagamento por desempenho ou performance, eles depararão com algumas armadilhas que poderão comprometer a credibilidade e a aderência ao programa pelos participantes. Neste artigo comentaremos alguns deles.

Imposição do modelo. O modelo de remuneração por performance deve ser um modelo não punitivo e voluntário, compartilhando-o ativamente com os participantes. Se houver imposição do modelo, das regras, dos critérios de comparação e do que será comparado, haverá uma resistência natural ao programa dificultando sua implantação e o atingimento do real objetivo do programa que é, ou deveria ser, a melhoria da qualidade da assistência médica.

Seleção de risco. Tradicionalmente os modelos atuais de consulta bonificada penalizam o médico que atende pacientes de alta complexidade, pois evidentemente estes pacientes têm necessidades diferentes dos demais, gerando mais exames, procedimentos, internações, dentre outros. Como isso, os indicadores do profissional que atende estes pacientes ficam comprometidos e pode prejudicar sua pontuação e conseqüente remuneração. O que foi observado em algumas Cooperativas que implantaram modelos simples de consulta bonificada é que os médicos evitavam ao máximo atender a estes pacientes ou comentavam com eles que já tinham atingido o seu limite de exames permitidos pelo convênio.

Diferença entre perfis na mesma especialidade. Generalizar o modelo de pagamento por performance comparando os médicos da mesma especialidade é um equivoco, pois, obviamente, dentro da mesma especialidade existem profissionais com perfis diferentes de atendimento. Vamos ver um exemplo dentro da Cardiologia: É comum termos um profissional que atendeu, durante o mês de análise, pacientes com idade média mais elevada que outros colegas da mesma especialidade. Evidentemente que o comportamento de cada um destes profissionais é diferente no que se refere a solicitação de exames, internações, custos gerados, etc, portanto utilizar o mesmo padrão de comparação não é adequado. Como este exemplo tem inúmeros em outras especialidades: obstetra que atende gestantes de risco, comparado com os obstetras que tem um padrão normal de atendimento; ortopedista que faz ombro, comparado com o que faz coluna, dentre outros tantos exemplos. Além disso, tem os casos críticos ou catastróficos que um médico é procurado para resolver. Este caso, indiscutivelmente, elevará todas as médias de utilização e custo deste profissional e, conseqüentemente, comprometerá o seu “desempenho” caso não for tratado individualmente.

Forçar redução da utilização abaixo do que a evidência preconiza. Isso foi observado em algumas operadoras com modelo de consulta bonificada. Os médicos têm suas médias avaliadas de acordo com o comportamento da especialidade. Todos os meses estes números são revistos e, portanto para ser “bonificado” é necessário ficar abaixo desta média. Com o passar do tempo a sub-utilização é explícita, onde indicadores de internação, exames e outros fica muito abaixo do que é tradicionalmente praticado pelo mercado. Esta atitude estimula a má prática média e deve ser abolida de qualquer modelo de remuneração por resultados ou desempenho.

Forçar a redução de custos valorizando indicadores de utilização e custo. Estes indicadores são chamados de indicadores de eficiência técnica ou indicadores de processo. O estímulo para que estes indicadores fiquem constantemente baixos leva uma ilusão por parte da gestão de que houve uma redução destes indicadores a partir de que o programa foi implantado, pois antes um determinado médico tinha um comportamento e depois da implantação do programa, este comportamento “melhorou” e seus indicadores de exames e custos diminuiram. No entanto, o que observamos em grande parte das operadoras que tiveram a consulta bonificada implantada, é que no geral não houve redução de custos e, conseqüentemente, da sinistralidade, pois o paciente deixava de fazer um determinado exame com um médico, e procurava outro ou ainda utilizada o pronto atendimento, mantendo ou ainda elevando o custo e a utilização geral da operadora.

Remunerar o desempenho do que passou. Nos modelos observados de “consulta bonificada” os indicadores avaliados são de dois ou três meses atrás e a remuneração se dá no mês da análise. Com esta remuneração mensal, não se permite um processo orientativo do médico para que ele possa ajustar ou justificar seu comportamento no mês vigente e assim permitir que ele busque atingir sempre o maior e melhor coeficiente de performance possível.

Percepção de punição. Embora se recomende que os programas de remuneração baseada na performance devam utilizar apenas estímulo positivo, ou seja, jamais reduzir o honorário médico, percebeu-se que o médico tem a sensação de que está sendo punido. Se o valor, por exemplo, de uma consulta sem bonificação é de R$ 40,00 e com bonificação é de R$ 50,00. Alguns médicos têm o entendimento de que o valor da consulta é R$ 50,00 e qualquer valor abaixo deste, é para puni-lo.

*César Abicalaffe é diretor da NAGIS

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