Aulas de física e produtos de beleza não têm, aparentemente, muito a ver. Mas, em Belo Horizonte, um professor do Departamento de Física da Universidade Federal de Minas Gerais desenvolveu com a ajuda da nanotecnologia um creme à base de ouro para reduzir rugas, manchas e dar elasticidade à pele.

Foto: Luiz Ladeira: pesquisa com nanomateriais despertou seu interesse por aplicações na área cosmética e o levou a desenvolver sabonetes e cremes à base de ouro

Luiz Ladeira, 61, conta que levou três anos para chegar à formulação atual do creme. Físico e pesquisador do Laboratório de Nanomateriais da UFMG, ele trabalha com fibras de carbono em escala nanoscópica e suas aplicações tecnológicas. Durante suas pesquisas, interessou-se também pelo uso de nanopartículas de ouro na medicina. Foi quando soube das aplicações na área cosmética. Nas horas vagas, passou a investigar no pequeno laboratório em sua casa qual seria a melhor concentração e quais elementos ligar ao ouro 24 quilates para que ele ficasse bioativo. Começou, então, a produzir de maneira artesanal o creme e a distribuir amostras para pessoas conhecidas.

“Quem usava sempre me pedia mais. Vi que havia um nicho para o creme”, diz Ladeira. Na formulação, ele usa ouro coloidal, que são partículas do metal na faixa de 1 a 50 nanômetros. Um nanômetro corresponde a 1 bilionésimo de metro. “O segredo são essas nanopartículas de ouro que são capazes de gerar uma interação física com a derme e trazer benefícios.”

Cosméticos à base de ouro são um negócio de grandes grifes. A alemã Être Belle, a suíça La Prairie e a americana Avon são algumas que já comercializam produtos com o metal. Elas sustentam que as propriedades do ouro ajudam a dar mais vitalidade à pele, que ajudam a protegê-la de toxinas, a dar uma aparência mais jovem e que apagam as imperfeições e linhas de idade.

Os preços de alguns desses produtos são dignos da fama dessas grandes grifes. Um potinho de 30 ml da La Prairie, por exemplo, é vendido pelo site da empresa por US$ 150. No boca a boca, em Belo Horizonte, um pote de 50 gramas do creme desenvolvido pelo professor Ladeira é vendido a R$ 50. E a linha está aumentando.

No mês passado, além do creme, ele bolou um sabonete com a mesma formulação. Preço: R$ 10. O professor deu ao seu creme artesanal o nome de Quilates, marca que ele pretende agora registrar e que sua filha, a bióloga Marina Ladeira, de 30 anos, doutoranda em fisiologia humana pela UFMG, está administrando. “Em duas semanas, vendi mais de cem sabonetes e cremes”, conta ela. “Estamos agora elaborando um plano de vendas, vamos ver se optamos por um esquema de venda direta ou se colocamos o produto em lojas”, diz ela.

Embora produtos à base de ouro sejam descritos pela indústria da beleza como benéficos à pele, ainda não há muita base científica para essa tese. “Os estudos sobre isso são muito escassos e não temos como afirmar que o ouro faz de fato bem à pele”, diz o médico dermatologista Jackson Machado Pinto, coordenador da disciplina de dermatologia da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais e ex-diretor da Sociedade Brasileira de Dermatologia em Minas.

Há muitos registros históricos de tratamentos de beleza com ouro. A medicina indiana, em particular, é pródiga nessa área. Mas do ponto de vista científico, não há documentação e pesquisas suficientes que atestem os efeitos estéticos do emprego de produtos á base do metal, diz Machado Pinto. “Os eventuais benefícios e eventuais riscos só serão conhecidos após anos de uso e pesquisas.”

Fonte: Marcos de Moura e Souza, Valor Econômico, 28/12/11