No último Encontro Nacional das Entidades Médicas, ocorrido em julho deste ano, eclodiu o Manifesto dos Médicos à Nação que inclui uma reivindicação específica sobre planos de saúde. Representados pelo Conselho Federal de Medicina – CFM, a Associação Médica Brasileira – AMB e a Federação Nacional dos Médicos – FENAM, os médicos declararam em alto e bom tom que a relação com as operadoras de assistência suplementar exige intervenção firme do governo. Segundo o Manifesto, “A defasagem nos honorários, as restrições de atendimento, os descredenciamentos unilaterais, os ´pacotes´ com valores prefixados e a baixa remuneração trazem insegurança e desqualificam o atendimento.”
e receba os destaques em sua caixa de e-mail.
Para dar uma idéia do desequilíbrio que permeia a relação entre operadoras e médicos, basta dizer que enquanto os reajustes das mensalidades ultrapassaram 136% nos últimos 10 anos, os percentuais aplicados à remuneração do médico não atingiram sequer 70%, segundo dados da Associação Paulista de Medicina. Outro dado alarmante é que em 2010 os planos de saúde pagam cerca de R$ 25,00 por uma consulta ginecológica e R$ 200,00 por um parto.
Os cidadãos que têm plano de saúde vivem dia a dia as conseqüências: médicos são, com freqüência, descredenciados, interrompendo o tratamento e a relação de confiança construída; a espera por uma consulta pode levar semanas e a consulta em si pode ser bem breve, pela pressão de um consultório lotado de gestantes e outras mulheres aguardando por atendimento.
Compatibilizar interesses entre os médicos, a população assistida e os planos de saúde significa o árduo desafio de equacionar assistência de qualidade e lucros. Se, de um lado, a razão de ser da iniciativa privada é a obtenção de lucros; de outro, a atenção à saúde, que aqui é o “objeto comercializado”, é condição para o bem estar e a vida digna.
Com a missão de regular e fiscalizar o setor, surgiu a Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS que vive um faz de contas que não tem trazido melhoras concretas e estruturais para o sistema de saúde. O ressarcimento ao SUS continua irrisório, apesar das reprovações contundentes do Tribunal de Contas da União – TCU; a fiscalização dos planos atinge apenas 17,2% dos consumidores; a restrição da cobertura aos atendimentos de urgência e emergência é vergonhosa. Durante seus 10 anos de existência, a Agência também tem feito vistas grossas para a situação precária dos médicos, como se não fôssemos essenciais para o atendimento e, mais importante, para o atendimento de qualidade.
A falta de formalização da relação entre operadoras e médicos somente foi considerada pela Agência em 2004, quando criou uma resolução obrigando as empresas a pactuar contratos com os médicos, estabelecendo regras de reajustes. A gritante desigualdade de forças entre o médico, ameaçado pelo descredenciado súbito, e a operadora, tornou a iniciativa inócua. Mais recentemente, a ANS determinou prazos máximos para atendimento de planos de saúde, sendo 7 dias o limite entre o agendamento e a consulta ginecológica. Apesar de aparentemente positiva, a medida não parece factível, porque desconsidera a proporção entre número de médicos credenciados em relação ao número de beneficiários do plano de saúde, assim como ignora a condição do médico credenciado que, devido à má remuneração, não consegue dedicar toda a sua agenda para os pacientes de planos de saúde.
Neste contexto, no mês passado, os ginecologistas e obstetras paulistas intensificaram o coro da luta pela valorização do trabalho médico e pela qualidade do atendimento aos pacientes no I Fórum de Honorários Médicos, realizado durante o XV Congresso Paulista de Ginecologia e Obstetrícia. Vestidos de preto, em sinal de luto pelos honorários vis dos planos de saúde e a interferência no exercício da profissão, os médicos afirmaram que “a situação atual é insustentável e, a continuar dessa forma, em breve não haverá mais médico interessado em trabalhar na saúde suplementar.”
Unindo as vozes dos ginecologistas e obstetras que apostam no diálogo, a SOGESP – Associação de Obstetrícia e Ginecologia do Estado de São Paulo iniciará a negociação direta com as operadoras por honorários dignos. Convictos de que a qualificação da assistência à mulher é interesse de todos, assumimos o compromisso de divulgar os resultados alcançados e os rumos da luta pelos médicos e pelas pacientes.
*César Eduardo Fernandes: presidente da SOGESP, Associação de Obstetrícia e Ginecologia do Estado de São Paulo
Você tem Twitter? Então, siga http://twitter.com/SB_Web e fique por dentro das principais notícias do setor.