A relação do câncer de próstata e mama – os tipos mais comuns em homens em mulheres depois dos tumores malignos de pele não-melanoma – com a religiosidade e espiritualidade de cada paciente é o tema de dissertação de mestrado da enfermeira oncologista Carolina da Cunha Fernandes, a ser defendida na pós-graduação do Hospital A.C.Camargo na próxima terça-feira, 28. O estudo conta com orientação da enfermeira oncologista e doutora pela Fundação Antônio Prudente/Hospital A.C.Camargo, Andréa Yamaguchi Kurashima e co-orientação da professora doutora e livre docente da Escola de Enfermagem da USP, Miako Kimura.

Entre novembro de 2010 e junho de 2011 foram entrevistados 300 indivíduos, sendo 75 homens entre 48 e 79 anos com diagnóstico de câncer de próstata, 75 mulheres entre 31 e 83 anos com diagnóstico de câncer de mama e outros 150 compuseram o grupo controle (pessoas da comunidade sem câncer).

Foram aplicados questionários que avaliavam dois diferentes aspectos. O primeiro buscou estimar os níveis de qualidade de vida dos pacientes em se tratando de bem-estar físico (disposição, qualidade do sono, mal-estar durante o tratamento, etc), social/familiar (apoio dos familiares, amigos, colegas de trabalho, etc), emocional (níveis de tristeza, ansiedade, etc), funcional (capacidade de executar tarefas do dia-a-dia) e espiritual (sentir-se em paz, vontade de viver, fé na cura, etc).

O segundo aspecto consistiu em avaliar a religiosidade através de seus três aspectos: organizacional (o envolvimento do paciente em atividades religiosas públicas), não organizacional (dedicação à atividades religiosas individuais como preces, rezas, meditações, leituras da bíblia ou de outros textos religiosos) e intrínseca (motivação pessoal e/ou grau de envolvimento, sendo que as crenças religiosas norteiam as ações do indivíduo).

De acordo com o estudo, os pacientes anseiam por maior envolvimento dos profissionais de saúde em se tratando de temas religiosos e espirituais, desejando que eles coloquem o assunto em pauta e ofereçam estes cuidados durante o tratamento. A maioria (97,3% dos homens e 86,7% das mulheres não havia conversado sobre suas crenças espirituais ou religiosas com algum profissional de saúde durante seu tratamento contra o câncer. “Observamos que a maioria deles gostaria que esta conversa tivesse ocorrido”, destaca Carolina, referindo-se aos 57,5% dos homens e 53,8% das mulheres que manifestaram este desejo.

Ainda segundo a dissertação, 81% dos homens e 76% das mulheres consideram importante que o profissional de saúde tenha interesse pelos assuntos espirituais e religiosos de seus pacientes. Grande parte, 73,3% das mulheres e 93,3% dos homens, afirma não ter recebido algum tipo de cuidado religioso ou espiritual de algum profissional de saúde durante sua terapia, porém a maioria (58,7% das mulheres e 69,3% dos homens) disse que gostaria de ter recebido este cuidado.

Além disso, a maioria (58,7 das mulheres e 69,3% dos homens) referiu que gostaria de receber algum tipo deste cuidado nos próximos passos do tratamento. Por fim, dos pacientes que afirmaram que não haviam recebido o cuidado religioso/espiritual do profissional de saúde, 61% das mulheres e 60% dos homens referiram que poderiam ter se sentido melhor ou mais dispostos ao tratamento caso os tivesse recebido.

De acordo com as pesquisadoras, este trabalho é um importante passo para que outras pesquisas possam explorar quais são as necessidades espirituais e religiosas dos pacientes oncológicos. “Os próximos estudos poderão buscar identificar a possível função de profissionais de saúde – enfermeiros, médicos, psicólogos e assistentes sociais-, de capelães e de membros das igrejas em relação ao apoio a ser oferecido aos pacientes no que concerne à estas questões. “Seria valioso se pudéssemos realizar uma avaliação espiritual e religiosa dos pacientes durante o tratamento para o câncer, assim como oferecer algum suporte nesta área”, aponta Carolina, que acrescenta: “Acreditamos que pesquisas qualitativas possam melhor definir quais são as reais necessidades e quais os significados e o impacto das crenças, da fé, da religiosidade e da espiritualidade na vida dos pacientes oncológicos, já que estes aspectos compõem a qualidade de vida relacionada à saúde reconhecida pela Organização Mundial de Saúde. Pesquisas longitudinais teriam condições de identificar se estes aspectos sofrem diferenciação no percurso da doença e seu tratamento. “Pesquisas longitudinais teriam condições de identificar se estes aspectos sofrem diferenciação no percurso da doença e seu tratamento”.

Carolina e suas orientadoras constataram também que homens com câncer de próstata apresentam escores mais elevados do que mulheres com câncer de mama em se tratando de bem-estar físico, emocional, funcional e espiritual (subescala de significado e paz). Nestes aspectos, não houve diferença estatisticamente significativa entre pacientes com câncer e grupo controle. Por sua vez, mulheres apresentam maior índice de religiosidade organizacional e intrínseca que os homens: pois costumam realizar mais frequentemente atividades religiosas públicas, e afirmam em maior número que suas crenças religiosas estão por trás de suas maneiras de viver.