Em recente encontro em Fortaleza foi possível observar, diante de uma palestra proferida por Jurandi Frutuoso, presidente do Conselho Nacional dos Secretários de Saúde (Conass), e ex-secretário de Saúde do Ceará, a distância que estamos de um modelo de saúde digno e que possa, a curto prazo, resgatar a dívida que o País tem por oferecer um sistema que atenda a todos do ponto de vista conceitual (o Sistema Único de Saúde), e que, na realidade, se traduza em um serviço onde o acesso seja fácil, rápido e de qualidade.
Por estas coincidências da vida me encontrei, após 10 dias da reunião de Fortaleza, em um castelo medieval na Europa onde nasceu a civilização portuguesa e, portanto, de onde originou a nossa.
Neste espaço em que me remetia à Idade Média, as principais autoridades de saúde da Inglaterra, Alemanha, Holanda, Portugal e Itália apresentavam as suas realidades individuais, onde o centro do debate era o financiamento da saúde pública européia e privada.
Mas saúde publica na Europa, em tese, não conversa com saúde privada. Ou melhor, não conversava: a Inglaterra, através do NHS, o poderoso regulador e provedor de saúde pública, começou um novo modelo, onde, a partir de janeiro de 2008, qualquer cidadão poderá escolher entre um hospital privado ou um hospital público para ser tratado.
É um modelo chamado de “patient on control” , que transfere ao cidadão a responsabilidade para selecionar o lugar onde quer ser atendido. É mais que uma quebra de paradigma e uma necessidade urgente de uma política de governo e suas inúmeras reformas políticas que estão levando o cidadão inglês a ter que esperar, algumas vezes, meses para um atendimento. Ao mesmo tempo, é uma forma de o governo buscar mecanismo de financiamento da saúde, cujas despesas crescem anualmente em função do rápido envelhecimento da população.
A Alemanha, que tradicionalmente tinha uma participação na medicina privada após a queda do muro de Berlin, percebeu que não seria possível oferecer o mesmo atendimento de qualidade em saúde que já existia no setor ocidental e que os investimentos para uma rápida adequação seriam um objetivo inatingível. Com o muro no chão, a Alemanha assistiu a uma segunda onda de hospitais privados na Alemanha Oriental, onde um grande grupo controla 45 hospitais, faturando em 2006 1,1 bilhão de euros, com um lucro de mais de 110 milhões de euros.
Portugal se apresenta como uma grande novidade. O sistema público rapidamente perde terreno para o setor privado. Os principais investidores no setor privado são bancos portugueses, que estão inaugurando também modelos PPP na construção, gestão e manutenção das instituições de saúde.
A Holanda é a vedete e vitrine européia, desde que o cidadão holandês, em 2006, foi obrigado a ter um seguro privado de saúde. As seguradoras têm prêmios sem restrição à idade e risco e o cidadão foi colocado como responsável pela escolha e co-responsável por 55% do custo do sistema. O governo contribui com 5% e o empregador, com 50%.
No primeiro ano, 15 % dos cidadãos trocaram suas seguradoras buscando melhores serviços, já que são diretamente responsáveis pelo pagamento deste modelo. Os cidadãos de baixa renda contam com um sistema de compensação onde o governo contribui com um percentual maior que o estabelecido pela nova regra.
Após ouvir as várias maneiras de organizar e financiar o setor de saúde, devo reforçar que mesmo países muito ricos estão, neste momento, com inúmeras iniciativas na busca de uma solução sustentável para seus respectivos sistemas de saúde, onde o setor privado torna-se protagonista sem deixar de ser regulador. E o mais importante: os europeus têm como valor a livre escolha das novas propostas de reforma. A livre escolha não significa, em nenhum dos planos, um descompromisso com a saúde e a qualidade da assistência, ao contrário, busca-se a eficiência que o Estado, pela sua lentidão e falta de recursos, não consegue oferecer.
Após ouvir as mais recentes experiências, me lembrei do que aprendi com o ex-secretário de Saúde do Ceara: o SUS faz muito pelos recursos que tem, porém, na Europa, acredita-se que, mesmo com recursos, ainda falta muito a fazer.
Nossa população também envelhece rapidamente, os recursos são muito menores e, se não buscarmos um caminho sustentável com iniciativa privada, não será possível formarmos uma nação digna em serviços de saúde, apesar de ser o nosso direito e um dever do Estado.
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