Regularmente pessoas mais jovens nos perguntam como investir na carreira: um MBA, outro idioma, certificação… e eu sempre pergunto: você conhece Excel?
Se a pessoa fala que conhece eu insisto: tem certeza que conhece os recursos que necessitaria conhecer?
O insano financiamento do sistema de saúde brasileiro obriga os gestores e analistas a fazer malabarismos com Excel para sobreviver. E quando alguém me diz: está tudo no sistema, eu dou risada!
Quer controlar o que pode ou não pode cobrar no SUS, em que situação, a que preço, e quais as compatibilidades entre procedimentos, CID e materiais? Você tem 2 caminhos:
- Passar horas e horas na frente da Tabela Unificada do Datasus (se a aplicação não for local: dias e dias), perder a paciência… e desistir;
- Ou gerar os relatórios em formato Excel, baixar os dados na sua planilha e manipular de forma simplificada!
Tem um terceiro caminho: tentar utilizar a interface automática do sistema da sua empresa com as atualizações do Sigtap numa ferramenta que chamam de BI. Quem já necessitou de uma informação que não está pronta e ouve que dá pra fazer? Sabe porque vou me permitir não comentar, ok?
O exemplo do SUS piora muito se falarmos da Saúde Suplementar. Existem coisas inimagináveis de serem feitas se não for com o uso do Excel:
- Comparar a tabela de preços anterior com o reajuste proposto e simular o novo perfil de faturamento daquela carteira;
- Decidir se migra a base de preços de uma tabela antiga para uma nova (ex: de AMB para CBHPM… ou a TUSS da operadora X? Sabe aquela tabela deveria ser compatível com a TUSS e não é?);
- Compor preços para definir ou decidir se aceita um pacote;
- Analisar a rentabilidade de um produto ou de um plano ao longo do tempo.
Nós, defensores ferrenhos da implantação de check-lists inteligentes para melhorar o registro e disseminar o conhecimento, perguntamos: como desenvolvê-los sem utilizar planilhas eletrônicas?
Certa vez desenvolvemos um check-list para cobrança automática de kits de enfermagem que cruzava dados de um kit com outro e não lançava itens repetitivos, ou exagerados (por exemplo: 48 horas de oxigênio em um só dia). Quem me conhece sabe o quanto sou devoto e não gosto de brincadeiras com questões religiosas, mas achei engraçado quando a enfermeira auditora disse que eu tinha parte com o…… porque não conseguia entender como aquilo podia ser feito em Excel.
O Excel é a ferramenta de gestão mais utilizada na gestão comercial da saúde, independente de você utilizar o melhor ou o pior sistema do mercado. No fim tudo termina em pizza, ou seja, você sempre acaba exportando dados do sistema, com mais ou menos dificuldade, e faz projeções e estatísticas em planilhas. Por isso o pessoal brinca afirmando que ERP significa Excel Resolve o Problema.
E o conhecimento que as pessoas têm dos recursos disponíveis no Excel é ridículo. Quem sabe um pouco mais que os outros se destaca rapidamente na gestão comercial e em outras disciplinas que o gestor comercial deve dominar. Por exemplo:
- No nosso curso de especialização em custos uma das primeiras disciplinas é sobre utilização básica do Excel, porque aprendi ao longo desses anos dando aulas que muitas vezes a dificuldade do médico e da enfermeira no curso não é entender o conceito de custos que está sendo discutido, e sim a construção da planilha de custos e suas fórmulas … e olha que planilha de custos tem fórmulas muito básicas!
Meus cabelos brancos permitem dizer que conheço raríssimas pessoas que tem conhecimento minimamente adequado da ferramenta para sua necessidade, até porque a quantidade de recursos que ela oferece, na minha modesta opinião, é tão gigantesca que é inviável conhecer bem a maioria deles.
O interessante é que uma minoria deles, quando bem assimilada, faz a diferença. Alguns recursos simples e imprescindíveis para gestão comercial que a maioria dos envolvidos não domina:
- Mesclar planilhas, fundamental para comparar preços;
- Concatenar linhas e colunas, fundamental para trabalhar com códigos e descrições;
- Comandos condicionais: SE, SOMASE, etc., fundamentais para produção de estatísticas;
- Argumentos de lógica: >, <, <>, etc., fundamentais para segregar códigos;
- Ocultar, reexibir, formatar, definir área de impressão, inserir senha e mesclar células, fundamental para a produção de tabelas de preços personalizadas.
- … e recentemente (para mim) o Google Drive, santo remédio para compartilhar planilhas também, passou a ser oxigênio na vida dos gestores.
É comum pensar que teria sido melhor ter escolhido outra carreira, porque as regras de remuneração do SUS e da Saúde Suplementar foram inventadas por gente que estava de mal com a vida? Gente que queria complicar as coisas e a vida dos outros.
Acho que você deve pensar a mesa coisa de vez em quando: talvez se tivesse estudado mais para passar no curso de medicina teria sido um bom investimento para não ter que passar o resto da vida calculando preços do sistema de saúde no Brasil na área comercial!
Mas já que estamos no baile temos que dançar com forme a dança… investir na capacitação em Excel é inevitável. E se dar conselho vale a pena, vou logo dando 3 de uma só vez:
- ninguém precisa ter aula com o Bill Gates. É muito melhor aprender com seres humanos normais e entendem a nossa necessidade prática do que com um nerd que vem ensinar um monte de coisas interessantes que só vão servir se você necessitar calcular o volume e peso de um tumor de pele algum dia;
- aproveite para perguntar para quem fez aquela planilha que você acha complicada como ele fez: é justamente esta planilha que lhe chamou a atenção que você precisa entender como se faz. Certamente vai perceber que o que a pessoa fez não é nada do outro mundo … é só Excel;
- o primeiro passo para entendermos que temos deficiência em Excel é ter a certeza de que por mais que achamos que conhecemos a ferramenta, ainda temos muito o que aprender para deixar de ser ruim nela!