O Concierge sempre foi símbolo de competência, atendimento impecável e único. Com o cenário atual, encontramos um desafio: como fazer isso em tempos nos quais não podemos ficar tão próximos do paciente para ouvir e conhecer a sua história e encantar com algo surpreendente ou até mesmo algo simples, mas que fará a diferença? Melhor ainda, como faremos isso sem que a saúde e a segurança dos colaboradores sejam afetadas? Tendo em vista que precisamos lembrar que caso acontecesse, teríamos um grande problema de absenteísmo… Sendo assim, vou contar a minha experiência.
Entrei de férias juntamente com meu marido em março e quando voltei, encontrei um hospital completamente diferente em fluxos, rotinas e caminhos. Confesso que me assustei e tive que parar por alguns minutos para assimilar tudo. Me lembrei de uma famosa citação do escritor e futurista norte-americano Alvin Toffler que diz:
“O analfabeto do século XXI não será aquele que não consegue ler e escrever, mas aquele que não consegue aprender, desaprender e reaprender”.
Sendo assim, reaprendi. Entendi os fluxos, acompanhei presencialmente e voltei para o meu andar.
Fomos nos adaptando e encontrando formas de realizar este acolhimento, sem perder a essência do calor humano. Para explicar melhor, vou dividir em duas partes: fluxo e rotina para POSITIVO e NEGATIVO (pois todos precisam sentir que estão em um local seguro).
COVID-19 positivo ou suspeito:
Para os internados, o concierge não realiza visitas presenciais mas faz contato telefônico e encaminha carta detalhando todos os serviços disponíveis como uma forma de demonstrar nosso acolhimento e nos colocarmos à disposição. Entre os serviços que oferecemos estão:
- Contato e tarifa acordo com hotéis (pois há pacientes que não podem voltar para casa após alta hospitalar por terem familiares do grupo de risco);
- Apoio religioso (presencialmente somente o católico pois temos o nosso próprio padre e acompanhamos sua saúde. Para as demais religiões, sugerimos o uso da tecnologia e realizamos o empréstimo);
- Empréstimo de carregador de celular, notebook e mesa para notebook;
- Lavanderia;
- Comemorações (outro ponto que tivemos que repensar. Algo rotineiro como organizar uma festa de aniversário, já não poderia ser feito como fazíamos antigamente. O simples fato de encher uma bexiga teve que ser revisitado para não colocarmos nossas gotículas dentro e reforçarmos a segurança. Sendo assim, agora usamos um inflador compressor para balões, enviamos um cartão personalizado, toda equipe assina mas somente o técnico responsável pelo paciente entra);
- Solicitação de Táxi;
- Orientações sobre trotes telefônicos, normas Covid-19, informações gerais do Hospital;
- Indicação de drogaria e serviços disponíveis;
- Informações de ramais.
COVID-19 negativo:
Todos os serviços citados acima são vigentes para os pacientes que o teste deu negativo. E agora, mais do que nunca, temos que focar na personalização do atendimento. Por exemplo, tive um paciente que em todos os anos o tema da festa dele de aniversário foi “arraiá”, pois nasceu em junho.
A família estava bem desanimada pois já tinha a pandemia para afastar de todos e ainda pensaram que a internação seria outro fator para “impedir” a comemoração. Conversando com a mãe, descobri várias informações, inclusive o tema de todos os aniversários anteriores. Sendo assim, pedi para me encaminharem as fotos favoritas deles, fiz um cartaz em tamanho A3 de convite para colocar na porta, pedi para a irmã organizar uma reunião com todos os familiares pelo Zoom para que todos pudessem participar, fiz bandeirolas personalizadas para colocar em cima da cama e toda a decoração foi com tema arraiá (como o bolo da festa, demonstrado na foto). Resultado: choro de felicidade, fidelização do cliente e uma família incrivelmente satisfeita.
Os que são covid negativo, as visitas introdutórias do serviço de hospitalidade continuam sendo passadas, porém com muitas diferenças. Logo no começo, não poderíamos mais oferecer os serviços religiosos, cuidados integrativos (musicoterapia, reike, acupuntura, relaxamento corporal), serviços de beleza, etc. Dentre todos os serviços citados, somente o padre que devido acompanharmos sua saúde conseguimos voltar. Todavia, os outros serviços ainda estão suspensos, mesmo para os negativos.
Temos também solicitações inesperadas: agora os pacientes – mesmo os não que não foram infectados com o coronavírus – querem sair com salva de palmas e festa! O corredor de bexigas e cores invadiu o coração dos pacientes e a emoção toma conta. Isto ocorre principalmente com quem é longa permanência. A organização deste corredor é por conta do Concierge: chamar a equipe multi, motivar todos a participarem, imprimir os cartões e encher as bexigas.
Há aqueles que saem com salva de palmas, mas infelizmente temos também os que vão a óbito. Seguindo a portaria do Ministério da Saúde apresentada em 25/03 tratando sobre o procedimento do manejo do corpo, foi implantado o reconhecimento do corpo digital. Isto é, quando o Concierge é acionado para orientar um familiar sobre as questões burocráticas do óbito, informamos sempre com muito respeito e cuidado, que agora o reconhecimento é feito via iPad. Confesso que este tem sido o ponto mais difícil, para mim, durante esta pandemia. Ouvir de um acompanhante dizer “posso olhar somente mais uma vez? Infelizmente será a única forma de me despedir dela.” é o que mais dói.
Fora todas as atividades mencionadas, intensificamos ainda mais o apoio às áreas assistenciais: agendamento de exames que não são necessários passar caso, solicitações e acompanhamento de vagas para gestão de leitos visando deixar os pacientes alocados nas unidades corretas (todos os pacientes são decididos juntamente com o hospitalista e enfermagem), ajuda no atendimento das campainhas, organização do pitstop, etc.
Organizo também ações como forma de reconhecimento e motivação à equipe multi. Recentemente, durante a semana da enfermagem fiz algumas ações, que inclusive postei aqui no LinkedIn, e isso os encantou. Cuidar de quem cuida neste momento é primordial para um trabalho efetivo e uma equipe engajada.
Todos os pacientes que entram no hospital para coletar exames de SARS-COV-2 também são acompanhados por um concierge. Se tiver sintomas, seguimos um caminho. Caso esteja assintomático, seguimos outro fluxo. Assim, temos um hospital seguro para todos.
Em virtude dos fatos mencionados, gostariam de saber como eu vejo o concierge hospitalar hoje? Estão fazendo a analogia do profissional de saúde como super-heróis. Digamos que o concierge é como se fosse o costureiro da capa. Se ela se rasgar ou algo der errado durante essa aventura que vivemos nos dias de hoje, o concierge costurará com sua graça, charme, carisma, empatia e resolubilidade. E se for um bom concierge, já terá uma capa pronta para o herói não esperar. (risos!)
Citando novamente Toffler,
“Mudança é o processo no qual o futuro invade nossas vidas.”
E não é exatamente pelo que estamos passando? O futuro chegou. E você, concierge hospitalar? Está preparado para o cenário atual? Comente sua experiência aqui também!
E assim seguimos, fazendo parte da equipe multi, nos reinventando diariamente e sorrindo com os olhos.
Sobre a autora
Nathália Cerda é Concierge com experiência em hotelaria hospitalar há 7 anos