Há mais de 25 anos atuo com a prevenção e o diagnóstico do câncer de mama e, recentemente, tive oportunidade de participar da jornada anual sobre o câncer de mama do Hospital Sírio Libanês. Ali o foco era nos Avanços e Perspectivas, no qual foi abordado uma das mais interessantes e recentes descobertas sobre o câncer de Mama.
Após assistir todas as palestras e acompanhar os resultados de inúmeras pesquisas sobre a genética molecular do câncer de mama, posso afirmar que estamos começando a vivenciar a era do genoma individualizado, que permite estabelecer qual é o risco potencial daquele tumor de se disseminar e vir a matar cada paciente. Em outras palavras, o câncer de mama tem múltiplas facetas ou personalidades e isso influencia profundamente no seu diagnóstico, no tratamento e no prognóstico de cada caso.
Em decorrências dessas características individuais é possível conhecer qual o câncer de mama que irá se beneficiar do tratamento quimioterápico, quais podem até ser prejudicadas por ele e, ainda, em quais caso a quimioterapia estaria formalmente contra-indicada.
Depois da codificação do genoma humano foi possível a identificação de regiões reguladoras no nosso DNA, assim como de áreas onde os RNAs não estavam codificados, o que permitiu identificar a imensa variabilidade dos genes humanos. E foi assim, graças ao sequenciamento dos genes tumorais, que se descobriu que os tumores de mama são muito heterogêneos e individuais e podemos prever que, no futuro, que já nos espreita, a oncologia será personalizada.
Por que é importante seqüenciar o genoma tumoral e as características da alteração genética no câncer de mama? Porque ao conhecer as alterações genéticas e determinar as características daquele tumor é possível predizer como essa doença vai evoluir e qual será a resposta ao tratamento. A genômica do tumor inaugurou uma nova era da cancerologia, baseada no sequenciamento genético. Antigamente custava uma fortuna fazer uma sequenciação do genoma humano e demorava anos. Hoje é possível realizar o sequenciamento do genoma em 27horas por US$ 6.000.
Atualmente o que existe de melhor é a classificação molecular do tumor. Somente quando você realiza uma análise da classificação molecular do seu tumor de mama saberá exatamente qual é o risco que ele esconde. É fundamental que você, caso venha a ter câncer de mama, exija do seu médico a classificação molecular dele, para saber realmente quão grave é a sua doença. Até um ano atrás, tínhamos apenas quatro subtipos de câncer de mama: o Luminal A, o Luminal B, o Basal e a Hiperexpressão do Her-2. Hoje, temos mais de 10 novos subtipos. O que abre as portas para a terapia personalizada do câncer de mama onde, cada tratamento, estará baseado no perfil mutacional do tumor.

Vale dizer que essa afirmativa não é válida para todos os tumores, pois a leucemia é um caso atípico onde todos os tumores têm o mesmo arranjo celular. Como ultrassonografista não posso deixar de traçar um paralelo entre o nível de atividade vascular observável no estudo Doppler do câncer de mama e sua agressividade. Quando temos poucos vasos no estudo Doppler da neoplasia, habitualmente os tumores têm boa evolução e temos pacientes deste grupo que já sobrevivem mais de 25 anos ao diagnóstico do câncer de mama. Por outro lado, os tumores ricamente vascularizados com inúmeros vasos nutrientes costumam evoluir para a metastatização (disseminação tumoral) e o óbito precoce da paciente.
Com a classificação molecular do tumor de mama tivemos a explicação genética para esses comportamentos tão díspares. Essas descobertas da ciência, nos ajuda a esclarecer cada vez mais os mistérios das doenças e nos dá os caminhos para curá-las.

*Dra Lucy Kerr é formada em medicina pela Universidade de São Paulo (USP), pós graduou-se em Ultrassonografia Diagnóstica pela Wake Forest University, como bolsista do CNPq e complementou seus estudos na Thomas Jefferson University, ambas nos EUA. É especialista em Ultrassom por quatro entidades nacionais (SUSEM-Sociedade Brasileira de Ultrassom em Medicina e Biologia, CBR-Colégio Brasileiro de Radiologia, AMB-Associação Médica Brasileira e SBUS- Sociedade Brasileira de Ultrassonografia) – além de duas internacionais (ARDMS – American Registry of Diagnostic Medical Sonographers e FISUSAL- Federação Internacional das Sociedades de Ultrassonografia da América Latina). É a Presidente-Fundadora da SBUS e Diretora Executiva Fundadora da FISUSAL. Atualmente é diretora da Sonimage- diagnóstico médico por Ultrassom e mantém vários cursos de ensino à distância aprovado pela comissão de acreditação da AMB para pontuação e renovação do título de especialista. O curso é veiculado pela internet com mais de 1100 horas aulas gravadas. A médica é diretora do Instituto Kerr uma ONG de Ensino, Pesquisa e atendimento popular.