Os tons lilases da gravata e camisa conferem elegância ao tradicional terno do gaúcho Alceu Alves, sem jamais inibir suas expressões e gestos espontâneos ao relembrar sua trajetória de 36 anos dedicados à saúde. ?Sou um médico frustrado?, revela o atual superintendente executivo do Sistema de Saúde Mãe de Deus (SSMD), que encontrou na administração hospitalar uma forma de ficar perto de sua paixão ? a medicina.

Do primeiro emprego na Aplub Previdência a chefe de gabinete de José Serra no Ministério da Saúde ? posição anterior ao Mãe de Deus ? a verdadeira escola do executivo foi o setor público; com nove anos de bagagem no Grupo Hospitalar Conceição (GHC) e 15 no Hospital de Clínicas de Porto Alegre, grande parte como vice-presidente.

A dedicação ao Sistema Único de Saúde (SUS) por tantos anos fez Alves questionar-se sobre o convite para gerir um hospital privado em 1998, mas a forte missão da instituição em prover um atendimento humanizado à população carente o levou a aceitar a proposta do atual diretor geral do grupo Mãe de Deus, Claudio Seferin.

?Eu precisava de um diretor qualificado e alguém que eu tivesse prazer em trabalhar. Foi aí que pensei no Alceu e tudo progrediu?, conta Seferin. Ambos se conheceram na década de 70, ainda no Conceição.

?Eu fiquei encantado, afinal, esse era o meu negócio, levar soluções para pessoas que precisam e, assim, começamos a trabalhar para eu vir para o Mãe de Deus?, recorda o executivo, que assumiu o cargo no dia 10 de novembro de 1998.

Perfil

Hoje a entidade filantrópica – mantida por uma congregação religiosa italiana e fundada em 1979 no Brasil – vai além da determinação que obriga a oferta de 60% dos leitos a pacientes do SUS, e chega ao índice de 76%.

Com a intensificação de parcerias na área pública, sob a gestão de Seferin e Alves, o Sistema congrega atualmente, além de quatro hospitais próprios – Mãe de Deus (POA), Giovanni Battista (POA), Nossa Senhora dos Navegantes (Torres) e Santa Luzia (Capão da Canoa) – outras cinco instituições públicas no interior do Rio Grande do Sul (Campo Bom, Taquara, Santo Antônio da Patrulha e Canoas), dois Centros de Atendimento Psicossocial, uma emergência psiquiátrica e a unidade de internação feminina São Rafael.

A prestação do serviço nessas unidades é feita através de parcerias com as prefeituras locais. ?O Estado define o tipo de serviço e nós o executamos?, explica o superintendente executivo. O Grupo Hospitalar Conceição, por exemplo, tem direito a 100 leitos de retaguarda no Hospital Universitário (HU), de Canoas, que está sob a administração do SSMD e em plena expansão de 350 para 500 leitos até o final do ano. A região é estratégica para a Saúde por ser um polo industrial, ter o segundo maior PIB e a quarta maior população do Estado.

Para uma eficiente gestão das unidades do interior do Estado, o SSMD opera por meio de um único sistema de gestão hospitalar. ?A ideia de centralizar a inteligência é fazer com que os prestadores não precisem se preocupar com compras, folha de pagamentos, entre outras questões administrativas, para manter o foco na qualidade assistencial?, conta Alves.

O Hospital

Apesar de ser um complexo assistencial, o Hospital Mãe de Deus é a maior referência em qualidade na alta complexidade e tecnologia do SSMD, constituindo-se como um verdadeiro polo de transferência de conhecimento às demais unidades. O hospital faz apenas atendimentos privados e é o único do sul do País com dupla certificação, ONA 3 e Joint Commission International (JCI). Frente a este protagonismo está apenas o também gaúcho Moinhos de Vento, detentor da JCI, e reconhecido pelo Ministério da Saúde como um

Hospital Excelência no atendimento ao SUS.

O Mãe de Deus – que prevê faturar R$ 370 milhões dos R$ 650 milhões projetados para todo grupo em 2013 -, possui uma governança corporativa consolidada. Estruturada em uma diretoria estatutária – composta por irmãs da congregação scalabrinianas -, e uma executiva – formada por profissionais das áreas da saúde e administrativa -, o seu planejamento estratégico está direcionado para a formatação de institutos de especialidades médicas.

?Percebemos que as especialidades vão fragmentando o conhecimento. Hoje é muito difícil o paciente ser tratado apenas por um médico. Por isso, congregamos especialidades em um conceito que chamamos de Instituto, com uma medicina altamente especializada e ao mesmo tempo fragmentada pelo corpo clínico multidisciplinar?, explica Alves.

Para a criação dos Institutos do Câncer, Medicina Vascular e Preventiva, o Mãe de Deus se aprofundou na epidemiologia do estado e constatou que a presença de idosos é numerosa e ainda mais concentrada em Porto Alegre. Dessa forma, câncer, doenças crônicas, mentais e respiratórias ? agravadas pelas baixas temperaturas na região ? são áreas foco do hospital. Para se ter uma ideia, o Rio Grande do Sul possui 45 idosos para cada 100 jovens e sua capital tem 62 para cada 100 (considerando jovem até 15 anos e idoso a partir de 60).

Ainda em consolidação, o objetivo é que os Institutos tenham capacidade de atender toda a rede de hospitais do Sistema. ?A ideia é que tudo que temos seja para todos. E as especialidades médicas estão sendo preparadas e assumindo funções corporativas para isso?, diz, com entusiasmo, Seferin, ressaltando que essa condição de atendimento tanto para plano de saúde quanto para o SUS é recebida com prazer pelos médicos do grupo que, hoje, são cerca de 600 sob o regime CLT e 800 autônomos, contemplando um quadro de 5250 funcionários.

Com 380 leitos operacionais e 54 leitos de UTI, o hospital está em plena expansão desses números para, respectivamente, 520 e 120 até a Copa do Mundo de 2014.

Os investimentos para os dois anexos que estão sendo construídos giram em torno de R$ 120 milhões, financiados pelo Banco Nacional De Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

Capital Humano

Com os mais de cinco mil funcionários e a escassez de profissionais qualificados no mercado, o SSMD fez da educação uma outra área de negócio e desenvolvimento social ao criar, em parceria com a Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), a Escola Superior de Saúde no final de 2010, que integra a área de Ensino e Pesquisa da entidade.

Com cursos de graduação, especialização, mestrado e extensão para diversas áreas da saúde, o centro tem a sustentação acadêmica da universidade e estrutura física completa do Mãe de Deus. Dessa forma, o SSMD tem condições de absorver os melhores profissionais formados na instituição.

Como a maioria das instituições filantrópicas e religiosas, o carinho e atenção aos pacientes são premissas valiosas e, no caso do Mãe de Deus, esse sonho foi idealizado pela irmã Jacomina Veronese na década de 60 e, segundo Seferin, depois de muitas remodelações para uma organização sustentável, enfim, tornou-se real; de uma maneira bem mais técnica e profissionalizada.