A inovação tecnológica e a digitalização no setor de saúde foram aceleradas pela pandemia. Embora a telemedicina seja um dos principais legados do período, a maior abertura para os ganhos médicos proporcionados pela aplicação de Inteligência Artificial (IA) e especialmente do aprendizado de máquinas (machine learning, em inglês), indicam a importância de investir no futuro dos dados para garantir os melhores cuidados habilitados por soluções de ponta, habilitando a saúde digital. 

Especialistas já preveem que o tamanho do mercado global para a IA em saúde deve disparar para US$ 28 bilhões em 2025, como mostram dados da Statisa. Até 2030, a previsão é de que os gastos desse mercado com IA atinjam mais de US$ 35 bilhões, crescendo 24% em relação aos US$ 2 milhões registrados em 2019, como indica a BIS Research. Diante dessas expectativas, o uso da IA, principalmente na nuvem, promete ser crucial para impulsionar a interoperabilidade e proporcionar maior precisão no atendimento médico e melhor gestão da saúde, permitindo colocar o paciente no centro.

A previsão do Gartner é de que, até 2025, os 10% das empresas que estabelecerem as melhores práticas de engenharia de IA vão gerar pelo menos três vezes mais valor de seus esforços do que os 90% das empresas que não o fizerem. A entidade destaca que o verdadeiro diferencial das organizações até lá será a capacidade de aumentar continuamente o valor por meio de mudanças rápidas de inteligência artificial. 

Apoio na atenção domiciliar

A saúde é o setor que mais gera dados hoje, representando 30% em todo o mundo, como aponta um analista da Forrester. A integração da IA/ML ​​a esse ecossistema pode habilitar uma infinidade de benefícios, incluindo a automatização de tarefas e a análise de grandes conjuntos de dados de pacientes de maneira mais ágil e eficiente. Não é coincidência que o HIMSS – Global Health Conference & Exhibition 2022, realizado em março nos Estados Unidos, tenha abordado este tema em diferentes painéis.

Os recursos habilitados pela combinação da IA/ML têm o potencial de oferecer melhores serviços de saúde com mais rapidez e a um custo menor. Um levantamento feito pela Insider Intelligence aponta que 30% dos custos de saúde estão associados a tarefas administrativas. A inteligência artificial e o machine learning podem auxiliar em algumas dessas tarefas, como pré-autorização de seguro, acompanhamento de contas não pagas e manutenção de registros, aliviando a carga de trabalho dos profissionais de saúde, economizando recursos, e permitindo que os profissionais de saúde foquem, cada vez mais, no paciente.

A facilitação de processos diários com o apoio da IA/ML também impacta diretamente na atenção domiciliar, frente em pleno crescimento em todo o mundo. Com o envelhecimento populacional, a demanda por profissionais que prestem esse tipo de cuidado está em alta. No entanto, há dificuldade de encontrar no mercado pessoas para acompanhar esse nicho. Pesquisa realizada em Wisconsin, nos Estados Unidos, descobriu que 85% das agências de home care não tinham profissionais suficientes para cobrir todos os turnos e 43% não preenchiam seus turnos pelo menos sete vezes por mês. 

O cenário se repete em outras partes do mundo e um dos motivos está na falta de um controle mais efetivo da gestão. Para atrair e reter talentos, fornecer um cronograma consistente e confiável de trabalho, permitindo planejamento é fundamental. Com o apoio de soluções informatizadas, amparadas pela inteligência artificial e pelo machine learning, já existem diversos produtos no mercado que auxiliam na otimização de cronograma e na gestão de escalas desses profissionais.

Diagnósticos mais rápidos e precisos

Por meio da IA e do aprendizado de máquina, a representação profunda de registros eletrônicos de saúde pode destravar a análise de pacientes em escala, como explica um artigo publicado pela Nature. O levantamento citado foi feito com base na análise de registros eletrônicos de mais de 1,6 milhão de pacientes de dezenas de milhares de clínicas diferentes.

Consciente dessa possibilidade, pesquisadores do Google treinaram modelos de aprendizado profundo (deep learning, em inglês) para identificar sinais que indicam riscos cardiovasculares de longo prazo a partir dos dados de mais de 280 mil pacientes. Posteriormente, a IA aprendeu sozinha o que procurar em imagens de retina depois de ter sido alimentada por dados suficientes para identificar padrões encontrados nos olhos de pacientes. Tradicionalmente, os médicos precisariam examinar manualmente a retina, fazer exames de sangue e considerar outros fatores como idade e Índice de Massa Corporal (IMC) para avaliar esses riscos.

A IA/ML também já está sendo usada para detectar doenças, como o câncer, com mais precisão e em seus estágios iniciais. De acordo com a American Cancer Society, uma alta proporção de mamografias produz resultados falsos, levando uma em cada duas mulheres saudáveis a ser informada de que tem câncer. O uso da IA ​​está permitindo a revisão e tradução de mamografias 30 vezes mais rápido e com 99% de precisão, reduzindo a necessidade de biópsias desnecessárias.

No Brasil, que caminha rumo à consolidação das regras para a telessaúde por meio do projeto de lei para o marco legal da IA, que hoje tramita no Congresso, a expectativa é de que a inteligência artificial e o machine learning comecem a ajudar com a saúde mental no trabalho. Um estudo da Oracle em parceria com a Workplace Intelligence, realizado em 2020 com mais de 12 mil pessoas em 11 países, mostrou que 87% dos brasileiros afirmaram que soluções de IA/ML são imprescindíveis para o monitoramento do seu bem-estar mental no ambiente de trabalho. Desta parcela, 64% prefere interagir sobre assuntos como estresse e ansiedade com um robô, ao invés do seu superior imediato.

Em vista dos avanços mais recentes, a atenção à saúde deverá se beneficiar cada vez mais das soluções proporcionadas pela aplicação da IA/ML, embora ainda estejamos vivenciando esta fase de ensaio e pivotagem de modelos promissores em termos de escalabilidade e resultado. Até que um padrão de produtividade ou conceito passível de aceleração seja alcançado, o investimento precoce em análises profundas de dados deverá permear a chegada de soluções disruptivas ao setor de home care e da saúde, de modo geral.

César Griebeler é VP de Tecnologia da Pulsati