O difícil equilíbrio entre os objetivos do corpo clínico e os objetivos da administração das instituições que atuam na área da assistência à saúde é um desafio que, na minha experiência de quinze anos no setor, precisa ser alcançado. E com a maior urgência.
Atuando na logística hospitalar em unidades públicas e privadas, tenho por vezes esbarrado em resistências às inovações tecnológicas que poderiam contribuir para o maior controle do fluxo de processos, com ganhos de redução de custos e maior segurança do paciente. O receio de um controle administrativo mais rigoroso na avaliação da produtividade do corpo clínico talvez justifique em parte essa resistência, mas os benefícios são inegáveis.
Vamos imaginar a cena: a enfermeira, munida de um palm top, percorre o hospital com a medicação a ser administrada aos pacientes. Chegando a um leito, lê o código de barras no pulso desse paciente acamado, confere no visor a medicação e dosagem a ser dada naquele horário. Em seguida, registra o código de barras do próprio crachá e finalmente registra o código de barras da medicação que será administrada, certificando-se de que aquele produto que está sendo ministrado ao paciente está correto, incluindo a rastreabilidade de seu lote. E mais: se a medicação está no prazo de validade, se é a dosagem prescrita e está sendo administrado no horário determinado pelo médico. Tudo em tempo real. Não é ficção: essa tecnologia, adotada hoje em alguns hospitais de excelência, já está disponível e acessível a todos os hospitais, não só aos privados, mas também aos sistema público de saúde.
Existem no mercado soluções para a rastreabilidade total, incluindo a gestão da administração de medicamentos, os controles e a rastreabilidade, da entrada no hospital até o leito do paciente.
Tais tecnologias, conhecidas como “Beira-Leito”, rodam em um PDA que fica nas mãos da enfermeira e permite administrar toda a medicação aos pacientes. A tecnologia permite uma substancial redução de custos em relação ao sistema anteriormente adotado por alguns hospitais, onde havia um computador em cada quarto, utilizado apenas para registrar a administração. As instituições de ponta já utilizam PDAs para esse controle, com sucesso.
Ao permitir à enfermagem conferir a medicação, ministrar o medicamento e fazer registro da administração da medicação diretamente nos leitos, requisitar produtos, entre outros procedimentos, essa tecnologia reduz o erro humano de um procedimento de difícil controle: o horário preciso de ingestão dos medicamentos, sujeito aos fluxos de pessoal, troca de turnos e imprevistos na rotina hospitalar.
A cultura da qualidade na gestão dos riscos precisa ser disseminada entre o corpo clínico das instituições hospitalares brasileiras, e o COREN e o CFM assumem papel relevante nessa transformação. Mais que aumentar a produtividade do corpo técnico, as novas tecnologias atendem a crescente demanda dos clientes por maior segurança e resolutividade.
Reações diante de propostas de maior controle de rotinas técnicas são compreensíveis, pois a adoção de novos sistemas exige treinamento e mudanças de processos de trabalho. Mas é preciso vencer barreiras culturais e não encarar novas práticas como ingerência na atuação profissional. Ou pelo ótica da suposta desconfiança do setor administrativo em relação ao corpo técnico. E sim, como uma forma confiável de impedir, por exemplo, que se ministre qualquer medicamento fora do horário, como ocorre com a dispensação manual. Além de aperfeiçoar o controle da farmácia, uma necessidade diante das últimas notícias sobre fraudes e desvios em escala nacional.
O controle de rastreabilidade de cada medicamento, de cada prescrição e de como foi ministrada cada dose e em que horário representa ganho considerável para a recuperação do paciente. E é hoje uma das grandes dificuldades da gestão hospitalar e também um dos principais critérios de acreditação de Instituições como ONA e Joint Comission, entre outras.
É inegável que caminhamos para a automação de ponta a ponta: do recebimento dos medicamentos e materiais médicos nos hospitais até a administração da medicação à beira do leito. A tecnologia de dispensação aumenta segurança do paciente, reduz desperdício de material e reduz custos para o hospital e, na atual economia, eficiência e gestão de custos é essencial para a sobrevivência de qualquer instituição.