FH: O senhor acha válida esta busca direta por informações, ou acredita que o exame só deveria ser feito se houvesse recomendação médica?

Souza: O DNA é seu, você tem direito ao acesso à informação. Isso não se pode restringir, exigir requerimento médico. O que é recomendável é que a mesma empresa que oferece o serviço seja também responsável pelo aconselhamento genético. A lei poderia ajudar a melhorar a qualidade da informação, condicionando a abertura destes serviços à qualidade e garantia de aconselhamento genético.

FH: O sequenciamento genético tende a tornar o paciente mais ativo na gestão de sua saúde?

Souza: Acredito que sim. Com informação útil, o paciente consegue embasar melhor suas decisões e fica mais preparado para lidar tanto com a prevenção como com o tratamento. O ponto crítico é que o componente genético é quantitativo. A alteração mostra uma propensão de desenvolver uma determinada doença, mas não é a doença em si. Com boas informações e educação, teremos pacientes mais literados, que vão pesar mais as opções e tendem a se cuidar melhor. Com isso, a prevenção deixa de ser apoiada em uma ideia abstrata e torna-se mais palpável.

FH: Quais são as principais linhas de trabalho do Instituto Ludwig?

Souza: No Brasil, o Ludwig trabalha na linha de virologia, coordenada pela Dra. Luisa Villa, cujo grupo esteve envolvido no desenvolvimento da vacina contra o HPV, e na linha genômica do câncer, área em que eu e meu grupo atuamos, juntamente com a Dra. Anamaria Camargo. Em câncer de mama, temos financiamento do CNPQ e trabalhamos também com outras instituições. Em câncer colorretal, atuamos junto com a equipe do Hospital Oswaldo Cruz, coordenada pela Dra Angelita Gama. Queremos usar a tecnologia para estudar os tipos de câncer, com o objetivo de identificar novos alvos para a terapia e descobrir as alterações genéticas associadas às características clínicas do tumor. A variabilidade de indivíduo para indivíduo está associada à diferença biológica. No caso dos anti-coagulantes, por exemplo, a dose é definida por estas diferenças biológicas. Em quimioterapia, dependendo das características genéticas, os efeitos colaterais podem ser maiores ou menores. Em câncer de mama há uma droga que só funciona para um terço das mulheres e não tem efeito sobre as outras. Esta análise é o que buscamos para trazer mais opções de tratamentos e tornar as terapias mais personalizadas. Hoje já trabalhamos com o conceito de que a genética do paciente define a conduta médica, a dose e o tipo de medicação.

FH: Muito se fala em terapia celular e genética e algumas empresas já se oferecem para congelar o cordão umbilical, como forma de armazenar uma possível cura para uma doença futura. Em seu ponto de vista, esta é uma iniciativa válida?

Souza: Se eu tivesse um filho, eu guardaria o cordão umbilical. Como cidadão, eu gostaria de aumentar o arsenal de opções para o caso de uma doença genética. As pesquisas com células-tronco estão crescendo e novas aplicações vão surgindo, apesar da janela entre o tempo de pesquisa e a aplicação efetiva da nova terapia. O processo para conseguir algo concreto é longo, dura mais de uma década, mas os avanços têm sido ótimos.

FH: Já começamos a acompanhar a criação de software específico para o mapeamento genético, a proliferação dos bancos de cordão umbilical e a maior especialização da indústria farmacêutica em medicamentos personalizados. Quais nichos de mercado ainda devem ser desenvolvidos com a evolução da genética?

Souza: No médio a longo prazo, a evolução mais importante será a realização de testes genéticos em laboratórios comerciais. O próprio SUS já reconhece alguns exames e eles terão um peso maior na área de diagnósticos, já que, com o acúmulo de informações, estes exames tendem a se tornar mais rotineiros. Acredito numa grande expansão nos próximos 20 anos. Outro nicho interessante é como explorar a informação e decodificá-la, a exemplo do que já faz a 23andMe. Hoje, as empresas oferecem o sequenciamento, mas outras companhias vão surgir para explicar o significado destes dados e oferecer aconselhamento genético.

FH: Sobre a indústria farmacêutica, você acredita que as grandes companhias terão a agilidade e flexibilidade necessárias para acompanhar as grandes mudanças nesta área, ou, como já começa a acontecer, elas tendem a buscar parceiros ou até adquirir empresas nascidas em incubadoras de universidades?

Souza: As companhias menores não vão conseguir realizar todas as etapas dos testes, que são caros. É natural que, na última fase, a de testes clínicos que envolvem pacientes, companhias inovadoras de pequeno porte sejam adquiridas por empresas maiores. As grandes farmacêuticas estão investindo em Pesquisa & Desenvolvimento para esta área e têm fôlego para levar as pesquisas até o fim, bem como recursos para buscar parceiros ou fazer aquisições no mercado. Acredito que há espaço para sinergias entre as pequenas e grandes empresas.

FH:O senhor acredita que, no futuro, a imunoterapia possa vir a substituir métodos hoje considerados agressivos ao organismo, como radioterapia e quimioterapia?

Souza: A imunoterapia atinge um alvo específico, de forma menos agressiva, então, permite que o paciente tenha uma qualidade de vida melhor. Já há várias drogas baseadas em anticorpos monoclonais e a tendência é de que este número aumente. Mesmo assim, não acho que a imunoterapia vai substituir a quimioterapia e a radioterapia, mas sim que todas estas terapias serão complementares.

FH: O senhor acredita na eficácia de uma vacina contra o câncer?

Souza: É mais complicado, mas há esta possibilidade. Hoje, acredito nas vacinas que conseguem atingir um agente específico, como é o caso da vacina contra o HPV, um vírus que pode causar câncer de colo de útero. Em outros tipos de câncer, não há este componente estranho. Hoje, acho a imunoterapia mais importante que a vacina, mas estas iniciativas não devem ser descartadas.

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