A difusão do sequenciamento genético traz não só novas formas de diagnóstico e esperança de tratamento para doenças crônicas e degenerativas, como também abre espaço para novos nichos de negócios e novas profissões. Membro do Young Global Leader do Fórum Econômico Mundial e coordenador do laboratório de Biologia Computacional do Instituto Ludwig de Pesquisa sobre o Câncer, Sandro José de Souza conta o que está no horizonte da genética e da bioinformática hoje e o que se pode esperar para os próximos anos.

Fornecedores Hospitalares: De que forma a bioinformática tem apoiado o sequenciamento genético?

Sandro José de Souza: A bioinformática abrange todas as áreas da biologia à medicina. O termo não existia até o começo dos anos 1970, mas surgiu para denominar a informática para fins biológicos, que se tornou mais conhecida a partir do início dos trabalhos de sequenciamento genético. Hoje, é uma ferramenta crucial para explorar esta área de genética, que se caracteriza pelo grande volume de dados.

FH: Você enxerga um nicho de mercado para empresas especializadas em softwares para bioinformática, ou ela ficará restrita às pesquisas acadêmicas e clínicas?

Souza: Este nicho já existe na Europa e, nos Estados Unidos, houve um boom da especialidade no fim da década de 1990, com o aquecimento do mercado e o acesso fácil ao crédito. Quando esta onda passou, muitas empresas faliram, mas hoje algumas estão de volta e vivem apenas de fornecer soluções para a área. No Brasil, já há duas companhias que se dedicam exclusivamente ao desenvolvimento de softwares para bioinformática.

O grande desafio para estas empresas é sobreviver nesta cultura de código aberto. A experiência mostra que uma companhia desenvolve um software e, dentro de um ano, uma solução semelhante surge em código aberto. É duro competir com isso. Uma saída para manter-se no mercado é desenvolver não só a ferramenta, mas também a estratégia, buscando explorar o problema junto com o cliente e oferecer o software e a infraestrutura para uma determinada linha de pesquisa ou atividade.

FH: Em nível global, qual é a posição do Brasil com relação ao uso da bioinformática?

Souza: O Brasil está bem. Embora tenha um número pequeno de pesquisadores, já que nossa comunidade científica é menor, a iniciativa genômica, desde os anos 1990, é bastante ativa e formou massa crítica. Hoje já há dois programas de doutorado na área, um de mestrado e uma sociedade de bioinformática que reúne centenas de participantes em seus encontros.   

Em nível global, acredito em uma nova revolução no sequenciamento genético em três anos, com novas máquinas e tecnologias para lidar com esta quantidade descomunal de informações.

Para se ter uma ideia, quando o Projeto Genoma começou, o orçamento era de US$ 2 bilhões e o sequenciamento levou anos para ser concluído. Hoje, é possível sequenciar o genoma em duas semanas, a um custo de US$ 30 mil.

Por outro lado, o grande volume de dados e aplicações do sequenciamento gera um gargalo de profissionais nesta área, o que coloca a Bioinformática como uma carreira promissora. No Brasil, a tendência é que esta deixe de ser uma especialidade apenas acadêmica e passe a ser também comercial. 

FH: Algum dia o sequenciamento genético será acessível à grande maioria da população ou este será sempre um procedimento de alto custo?

Souza: Acredito que o sequenciamento genético tende a se tornar cada vez mais barato, chegando a US$ 1 mil, o que o tornará acessível a uma parcela maior da população. Com isso, podemos imaginar que vá aparecer uma empresa brasileira de sequenciamento genético para o usuário final, a exemplo do que já existe nos Estados Unidos com a 23andMe, por exemplo.

FH: E qual é sua opinião sobre empresas como a 23andMe, que começam a oferecer o sequenciamento genético à população/consumidor final? Este tipo de exame é realmente útil às pessoas?

Souza: Há aspectos éticos e legais a serem considerados, como a proteção da informação e a busca por garantias, como a de que as empresas não usarão o sequenciamento genético para excluir usuários dos planos de saúde ou cobrar valores muito elevados de quem tem predisposição a alguma doença. Nos Estados Unidos, já há uma lei que regulamenta isso, mas no Brasil isso ainda não existe.

Outro dilema é o que fazer com a informação quando se identifica o risco de o paciente desenvolver uma doença incurável. A doença de Huttington, por exemplo, que provoca desordem neurológica, já pode ser identificada em bebês, embora só se manifeste entre adultos e idosos, mas não tem cura.

Quando existe uma solução, a exemplo da identificação da predisposição ao câncer de mama, acho válido informar a paciente, mesmo que ela opte por um método de prevenção radical, como a mastectomia antes do aparecimento do tumor.  

Leia mais: Continuação – Evolução da pesquisa genética traz novas oportunidades para a saúde

Você tem Twitter? Então, siga http://twitter.com/SB_Web e fique por dentro das principais notícias do setor.