A ideia era discutir o futuro, mas os problemas presentes das organizações sociais de saúde (OSS) são tantos que o passado ainda polariza o debate. É o que se pôde verificar nesta terça-feira (26) durante o I Fórum de Gestão de Saúde, organizado pela consultoria Planisa em São Paulo (SP). O superintendente dos hospitais afiliados da Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina (SPDM), Nacime Salomão Mansur, foi categórico ao afirmar que, apesar dos indicadores positivos das instituições administradas por OSS, o modelo ainda é considerado ?motivo de vergonha? pelo Estado.
?Vivemos um futuro de ameaça a este modelo?, sentenciou Mansur. ?As OSS ganham em todos os indicadores na comparação com hospitais de administração direta. Possuem indicadores muito melhores?, disse o administrador, citando estudo que mostrou taxas de ocupação 20% maiores, redução do número de óbitos previstos e do orçamento de custeio. ?São números muito contundentes?, salientou.
Alguns indicadores, como o número de horas de treinamento dos profissionais, superam os dos hospitais privados membros da Anahp. ?O modelo das OSS permitiu introjetar no sistema público modelos de gestão que não existiam na administração direta. Isso se deve à necessidade de buscar performance, graças aos orçamentos limitados.?
No entanto, Mansur diz que a disseminação do modelo ainda está ?muito longe? do ideal devido à ?insegurança jurídica brutal dos contratos?, referindo-se à paralisia do julgamento da ação de inconstitucionalidade contra o modelo no Supremo Tribunal Federal. ?O Estado se julga no direito de fazer ou não os repasses, descumpre contratos, faz descontos não justificados.?
Mansur ressaltou ainda que a insegurança jurídica está prejudicando a renovação do modelo, que desde o início da década de 2000, quando foi implantado, adota os mesmos tipos de contrato, sem premiação por performance ou por certificações obtidas. Para ele, esse cenário desestimula aumentos de produtividade e contribui para o sucateamento dos hospitais.
Boa parte das dificuldades das OSS, diz o administrador, refere-se ao peso do Estado sobre as organizações, inclusive com intromissões indevidas. ?Todo dia estamos no jornal por que um promotor acha que existe algum crime, mas a ação acaba arquivada pois não há nenhum substrato. Até hoje o MP não ajudou em nada, só atrapalhou, não mostrou luz ou caminho. É sempre uma permanente criminalização da [nossa] ação.?
Outra intervenção apontada por Mansur é a tentativa de impor às OSS os mesmos processos de gestão dos órgãos públicos, inclusive em processos licitatórios. O ?garrote burocrático?, como define, estaria asfixiando e matando o modelo impedindo exatamente o que ele tem de inovador.
?O modelo passa também por uma expansão desordenada. Não há alternativa, pois o poder público não consegue administrar [os hospitais]. Particularmente em São Paulo várias OSCIPS [Organização da Sociedade Civil de Interesse Público] estão se passando por OSS. É o risco inerente de qualquer modelo e que vem trazendo uma série de constrangimentos?, ponderou.
Juridicamente
Participou do debate o advogado e sócio do escritório Rubens Naves, Santos Jr, Hesketh Escritórios Associados de Advocacia, Rubens Naves, que se mostrou menos pessimista quanto aos rumos das OSS. Para ele, o modelo ?tem muito a trazer para nossa transformação econômica e social, atender nossa necessidade de oferecer serviços públicos de mais qualidade?.
O advogado acha que mesmo a percepção política das organizações sociais tem melhorado. Em São Paulo, citou, durante as últimas eleições municipais, um dos candidatos líderes da pesquisa [Haddad] chegou a prometer o fim das OSS, mas não só reviu o posicionamento quando foi eleito como atualmente pretende ampliar sua participação na Saúde da cidade.
?O secretário de Saúde [José de Filippi Junior] revelou a intensão de expandir o modelo na cidade. Trazer hospitais privados estratégicos como parceiros, apostar em políticas de contratualização. É um modelo que se expande para todo o Brasil?, disse Naves.
Para ele, as resistências ao modelo possuem fundo corporativista, que é natural da área da Saúde, e o julgamento da constitucionalidade do modelo pode ser favorável, a julgar pelos dois votos já proferidos por ministros do STF.
Quanto polarização das opiniões negativas sobre as OSS, Naves aponta questões políticas e ideológicas que precisariam ser combatidas através do diálogo entre as próprias organizações e de um esforço de comunicação conjunto. ?Se a gente perde a guerra da comunicação, temos grande chance de perder também na Justiça. As lideranças precisam se articular. Há um individualismo muito grande por parte das OSS, e o diálogo é muito pouco?, disse.
Para o advogado, o esforço de comunicação deve se aliar à uma prática de transparência absoluta. ?A sociedade precisa ser aliada das OSS. Elas precisam dialogar com o público. Os resultados obtidos vão de encontro às nossas necessidades.?