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Carlos Alberto Miranda é Mestre em Administração de Empresas e possui MBA em Finanças pelo IBMEC RJ. Foi sócio da Ernst&Young e responsável pelo Premio Empreendedor do Ano durante 5 anos. Atualmente é CEO da gestora de Venture Capital BR Opportunities, é do Comitê de Empreendedorismo e Capital Semente da ABVCAP e Voluntário da Endeavor.

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Sempre me impressiono com o grande número de pessoas que desejam empreender e, como estamos acostumados a ouvir, serem os seus próprios patrões. Se por um lado isso demonstra e reforça que o Brasil é um país empreendedor (8o do mundo), por outro lado indica que as pessoas não estão satisfeitas com os seus atuais patrões que, em última análise, são grandes corporações (nacionais ou multinacionais), empresas estatais ou empreendedores de sucesso.

Esse outro lado me preocupa muito. Quando nos ocupamos em conversar com várias pessoas empregadas, e até as muito bem empregadas, verificamos que a principal motivação para esse desejo é, muito mais estar cansado do mundo corporativo do que propriamente vontade de empreender. Sabemos que pessoas com “pegada” empreendedora tem potencial de gerar grandes negócios, estejam elas à frente dos mesmos ou como parte do grupo responsável por fazer acontecer uma organização já existente. O que está acontecendo então nas organizações que está fazendo as pessoas se desmotivarem e não pensarem de forma efetiva como parte do negócio? As organizações existem, de uma forma extremamente simplista, para através de um modelo de atividades organizadas gerar e vender serviços ou produtos, que no final, gerarão lucro para essa entidade, recompensando todos os envolvidos de forma desproporcional ao capital investido, risco tomado, desempenho, competências e horas empregadas.

Para que tudo isso aconteça, foram criados fluxos, processos, hierarquias, avaliações de desempenho, infra-estrutura, entre outros. Porém, para que essa máquina funcione, colocamos pessoas confinadas o dia todo no mesmo espaço, com aspirações e valores completamente diferentes e que, por um princípio natural, querem antes de tudo sobreviver. É nesse momento que aquela estrutura criada que, em última análise, deveria servir para viabilizar sonhos de empreendedores (tanto fundadores como colaboradores), torna-se mais importante que o negócio e a criatura supera o criador, transformando-se em muitas das Corporações que conhecemos hoje. Nessas corporações, o sonho perde a identidade e a máquina burocrática criada pelas pessoas mais preocupadas com a própria sobrevivência, passa a ser o objeto principal e a prioridade de todos. Deixando o “core business” quase que em segundo plano.

Nesse modelo, processos burocráticos são criados e perpetuados, servindo de abrigo para os incompetentes e covardes. Parece que eu estou sendo muito duro, e estou sendo mesmo, as empresas e os líderes não se dão conta que esse processo emperra a criatividade, o arrojo e, consequentemente, o crescimento e o sucesso da organização. A isso tudo que falei podemos agregar as vaidades, os jogos de interesses e a política (no péssimo sentido da palavra) que fazem com que essas empresas fiquem cada vez menos competitivas e atrativas para potenciais novos colaboradores e, pior, fazendo com que os atuais entrem no jogo do faz-de-conta das corporações.

Se fosse possível mensurar o tempo real que uma pessoa nesse estado consegue dar de atenção aos seus desafios naquela organização, nos surpreenderíamos com a quantidade de horas dedicadas a: administrar conflitos internos, o jogo da sobrevivência (quem puxa o tapete de quem), o tempo com processos burocráticos e inúteis, o tempo para se recuperar dos traumas gerados por esses processos, entre outros. Arrisco dizer que aproximadamente 40% do tempo que uma pessoa passa dentro de uma organização é perdido com coisas que de forma alguma geram valor para a mesma. Onde o empreendedor entra nisso? Esses modelos que acabei de descrever foram criados há muitos anos em realidades tecnológicas, sociais, familiares e de qualidade de vida completamente diferentes da que temos hoje. Os empreendedores têm a grande chance de pensar fora da caixa na hora de estruturar a sua organização e, além de pensar em um novo modelo de negócio, porque não fazer o mesmo e quebrar paradígmas nessas em questões organizacionais.

O que afinal queremos das pessoas, o seu tempo ou o seu talento e resultados? Será que preciso realmente criar determinados processos dentro da minha empresa ou posso já nascer com boa parte deles fora da mesma? E a hierarquia que criamos, faz sentido no modelo que conhecemos? Nos processos decisórios os mais novos são ouvidos? Conseguem falar antes dos mais velhos?

Enfim, creio que esse será o nosso grande desafio para perpetuarmos os nossos negócios: criar de fato organizações a serviço de nossos sonhos e destruir (ou nem criar) as corporações.