Despiu-se de suas vestes e valiosa herança quando ainda era jovem, e inspirou milhares de seguidores a ter uma vida pobre de bens materiais, mas rica em devoção ao próximo. Oito séculos mais tarde, também conhecido por seus hábitos frugais, paralisou milhões de pessoas no Rio de Janeiro durante uma semana em prol do amor e da simplicidade. O tempo não foi capaz de distanciar dois líderes históricos, unidos por suas convicções que, até hoje, se fazem presentes. De Francisco à Francisco, ou mais precisamente, de São Francisco de Assis ao Papa Francisco foi a reflexão proposta pelo filósofo e professor Mario Sergio Cortella aos mais de cem gestores do setor durante o encerramento do Saúde Business Forum 2013, realizado na Ilha de Comandatuba, Bahia. Salvo as diferenças das épocas, o recém-eleito Papa Jorge Mario Bergoglio fez questão de escolher o nome Francisco como referência à simplicidade e dedicação aos pobres de São Francisco de Assis. Em discurso em maio, o Papa afirmou que a solidariedade é o verdadeiro tesouro do homem e que o culto ao dinheiro produz desigualdades e injustiças contra corações e povos. ?O dinheiro deve servir e não governar?, disse citando o teólogo do século VI São João Crisóstomo. Submetidos os seres humanos a uma mentalidade consumista e predadora, segundo Cortella, ambos os Franciscos são exemplos do não comodismo, do não conformismo, do ser não ?pusilânime?, ou seja, acovardado. ?O cardeal que assumiu é admirável e tem algo que Assis também teve, coragem para romper, para não se habituar à putrefação, à desertificação do futuro e à esterilização da nossa vida coletiva?, profere Cortella, que consegue arrancar com frequência risos da plateia, mesmo em meio a frases contundentes. O filósofo faz inúmeras digressões na história da humanidade para evidenciar o ?espírito? degradante das civilizações, passando pelas invasões do império romano até a morte rápida dos importantes rios Tietê e Pinheiros. ?Matamos uma fonte de vida milenar. Aquilo fede e a gente se acostuma?, diz o professor, provocando a plateia ao lembrar o quanto todos usufruíram as ?maravilhas? de Comandatuba nos dias anteriores. Ter fé, ser inspirado, e agir são características comuns aos Franciscos. Assis, em pleno século XIII, não se fechou em conventos e monastérios como de costume, abdicou de todo o conforto familiar para viver no meio do povo e ?resolver o que era preciso, construir igrejas etc?. ?Ele mostrou três grandes virtudes para não apodrecermos nossa vida: coragem, humildade e esperança. Mostrou que há uma sã loucura, ou uma loucura sadia?, afirma Cortella, ressaltando que é preciso coragem para não ser pusilânime. No século XXI, a ruptura de paradigma pode ser simbolizada pela renúncia do Papa Bento XVI em fevereiro deste ano, antes mesmo do conclave, seguida pela eleição de Francisco, o primeiro Papa não europeu em mais de 1200 anos e o único jesuíta da história até então. Além de seus costumes, que dispensam pompa e protocolos. Como cardeal em Buenos Aires,
Francisco vivia num pequeno quarto atrás de uma catedral e costumava se locomover com metrô e ônibus. Eleito Papa, suas vestimentas são mais simples do que de seus antecessores e atividades como pagar contas, fazer telefonemas, entre outras, ele mesmo prefere fazer. ?A primeira declaração dele foi sobre afeto e fraternidade. Sem usar a palavra católica, ele se dirigia a todos como irmãos, falava em fraternidade de fé?, diz Cortella, lembrando, mais uma vez, que é preciso coragem para não ser pusilânime ? lição deixada pelos Franciscos àqueles que querem fazer a diferença como cidadãos ou como representantes de instituições que prezam pela vida do próximo, como é o caso da Saúde.
Cortella: lições de liderança de Francisco de Assis ao Papa
Filósofo e professor Mario Sergio Cortella falou de coragem, humildade e esperança como valores preservados pelo tempo e ainda efetivos para o verdadeiro líder
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