Investimentos expressivos de hospitais e instituições privadas em pediatria são cada vez menores, salvo raras exceções. A máxima é válida também para os próprios profissionais, afinal a especialidade é uma das menos procuradas pelos estudantes, e já começam a faltar médicos para atender as crianças brasileiras em consultórios e unidades básicas. No entanto, esse ?vazio? deixado pelo mercado também pode ser visto como uma boa oportunidade.

Pensando assim o Hospital Leforte, do Grupo Saúde Bandeirantes, inaugurou este mês um espaço exclusivo para atendimento ambulatorial pediátrico. Localizado a poucos metros da entrada do prédio principal da instituição, o centro nasce de uma parceria com a Clin Kids, clínica pediátrica localizada no bairro de Santo Amaro, na capital paulista, que começou a pouco mais de seis meses.

?O Leforte nunca foi conhecido pelo atendimento pediátrico?, explica o coordenador da equipe de especialistas em saúde infantil do hospital, Fábio Bedoni, também sócio da Clin Kids. ?A ideia era investir em um mercado que tem espaço atualmente, para fortalecimento da própria instituição. Fazer um lugar específico e humanizar o atendimento.?

A estrutura do ambulatório pediátrico foi instalada primeiro dentro do próprio Leforte, mas a instituição investiu na reforma de parte do centro de convivência dos funcionários, a poucos passos do hospital, para abrigar a estrutura. Embora até esta quinta-feira (26) o atendimento ainda não tivesse começado ? devido principalmente a algumas pendências na instalação dos sistemas de TI -, Bedoni prevê o início das atividades logo após o Carnaval.

Além da sala de triagem, são quatro consultórios com leitos exclusivos para repouso infantil, além de sala de emergência para casos mais graves, sala de procedimento, dois leitos de UTI neonatal e oito leitos de UTI infantil, além de sala de medicação.

Segundo o coordenador, o Leforte realiza atualmente cerca de 3,5 mil atendimentos por mês, número que deve crescer em 2 mil com os atendimentos eletivos do centro pediátrico. A demanda, no entanto, vem do próprio hospital – e dos habitantes da região -, principalmente de pacientes internados que precisam de acompanhamento clínico e cirúrgico, mas que correm riscos desnecessários ao dividir ambientes com pacientes adultos.

Corpo clínico e negócios

A equipe de pediatria será coordenada por Fábio Bedoni e Denise Bedoni, pediatras fundadores da Clin Kids. Carla Donato, presidente da Sociedade Brasileira de Oncologia Pediátrica, será responsável pela área de oncopediatria. Além deste especialidade, a estrutura atenderá em alergologia, dermatologia, cardiologia, nefrologia, neurologia e outras especialidades pediátricas.

?O objetivo é montar o serviço de quimioterapia e aumentando a complexidade até chegar ao transplante de medula?, explica Bedoni. No total, serão entre 30 e 35 médicos atendendo no novo ambulatório, contando com suporte de aproximadamente 50 funcionários, entre enfermeiros e atendentes.

Mas, como tornar o negócio da pediatria viável? Como obter retorno do investimento?

?Conseguimos mudar a perspectiva e a pediatria até agora não deu prejuízo [para o Leforte]?, diz Bedoni. O segredo é aumentar o número de atendimentos de alta complexidade, por consequência fazendo crescer a entrada de recursos para ?manter a estrutura de baixa complexidade funcionando?.

Faz parte da mudança no fluxo de atendimento das crianças e adolescentes no hospital a inauguração de uma ala de observação infantil, prevista também para esta quinta-feira (26), que embora dentro da estrutura primária do Leforte já indica a atenção estratégica (e assistencial) dedicada à especialidade.

Mas é claro que nem tudo são flores: encontrar pessoal especializado é um grande desafio. ?Encontrar pediatras realmente está difícil, é preciso ?garimpar? para conseguir uma equipe boa?. Outro desafio: mostrar para as operadoras de planos de saúde que vale a pena remunerar de forma diferenciada um serviço agregado. ?Elas tem certa resistência a credenciar em conjunto, devido à rotação do paciente, por considerarem que as internações são forçadas. Esse julgamento só se quebra mostrando qualidade?, diz Bedoni, segundo o qual as negociações com os planos já estão avançadas.

Clin Kids

Instalada há cerca de 18 anos na Avenida Washington Luiz, em São Paulo, a Clin Kids é especialista em atendimento infantil, e inclui entre seus serviços hospital-dia, pronto atendimento, centro cirúrgico e apoio diagnóstico (incluindo endoscopia pediátrica). Realiza ainda trabalhos com escolas particulares da região, como saúde escolar (incluindo bucal) e, o mais inusitado, resgate de estudantes que precisem de atendimento.

?Temos uma estrutura limitada pelo espaço. [A parceria com o Leforte] é uma oportunidade de obter retaguarda para casos mais graves, e de realizar cirurgias maiores.? Bedoni explica que a parceria com o hospital do Grupo Bandeirantes funciona no esquema de divisão dos resultados, embora não releve exatamente que porcentagem corresponde a cada parte. Mas é certo que ao Leforte cabe a construção e fornecimento da infraestrutura, e aos médicos a prestação do serviço.

É a primeira parceria em que os médicos da Clin Kids atuam diretamente dentro de outra instituição, embora já tenha prestado outros serviços em outros modelos. ?A ideia é fazer a gestão da pediatria em uma estrutura que era deficitária?, explica Bedoni.