Houve um movimento de mudança intenso na forma como as famílias alocam seus orçamentos nos últimos cem anos. Um estudo do prêmio Nobel de economia Robert Fogel mostrou que as famílias de classe média dos países desenvolvidos gastavam, no início do século XX, 80% de sua renda com alimentação, vestuário e moradia. Cem anos depois, os mesmos itens absorvem menos de 1/3 do total de recursos da mesma família hipotética, dando lugar a gastos com entretenimento, educação e saúde.

?No Brasil atual uma família mediana gasta 62% de sua renda com alimentação, vestuário e moradia. Esse movimento das famílias representativas de países desenvolvidas ainda está acontecendo no Brasil, e nossa classe média vai ser a narrativa do que foi a americana do século passado?, refletiu o economista e sociólogo Eduardo Giannetti da Fonseca durante a palestra de abertura do Saúde Business Forum 2013, que aconteceu nesta quinta-feira (19) na Ilha de Comandatuba, na Bahia.

Diferente dos EUA no entanto, disse Giannetti, as ?escolhas da nação brasileira? podem prejudicar esse processo, principalmente devido aos baixos investimentos do estado brasileiro em capital físico e intelectual. ?O dreno de recursos que o estado intermedia e transforma em gasto corrente vai ter que mudar se o Brasil quiser construir um futuro. Ele arrecada 36% do PIB, a chamada carga tributária bruta, mas gasta 39% e investe apenas 2,5%?, ponderou Giannetti.

A situação é ainda mais grave em dois pontos fundamentais: educação e saúde. ?Cerca de 36% dos egressos no ensino superior brasileiro são analfabetos funcionais?, lamentou o economista, que vê neste capital intelectual um possível princípio de uma base de desenvolvimento sustentável e sustentado. ?Porque um trabalhador de um país de alta renda gera de 4 a 5 vezes mais riqueza que em um país de renda média? A diferença está fundamentalmente no estoque de capital físico e humano. É a diferença entre trabalhar com uma enxada e um trator?, analisou.

Para o economista, o Brasil está indo mal nesse processo pois investe pouco. O País, diz ele, está passando pelo melhor momento demográfico possível ? em que a maior parte da população é economicamente ativa frente a uma minoria de idosos e crianças ? sem acelerar a produção de riqueza, ou seja, sem aproveitar o ?momento mágico na vida de um País para criar as bases do desenvolvimento?.

?O problema é que essa demografia favorável vai se virar contra nós. O que é hoje uma pirâmide etária vai começar a virar um cogumelo. O grande risco que o Brasil corre é o de envelhecer antes de enriquecer. Quero ver como o País vai lidar com essa transferência da renda entre as gerações?.

Política e sucessão

Quando perguntado pela plateia, Gianetti declarou estar envolvido na candidatura da ex-senadora Marina Silva, que atualmente se concentra em fundar um novo partido a tempo de concorrer às eleições presidenciais de 2014. O economista participa da formulação de um futuro programa de governo cujas bases, disse ele, se concentram na formação de capital humano ? a partir do investimento maior em saúde e educação ? e nos princípios de sustentabilidade.

?Ela [Marina Silva] não aceita o presidencialismo de coalizão, lotear o governo de porteira fechada para facilitar apoio no congresso, que não se confirma efetivamente no dia a dia?, disse Gianetti, criticando indiretamente o atual governo de coalizão da presidente Dilma Rousseff. ?Democracia existe para que formas diferentes de visão de futuro se confrontem, e o projeto vencedor deve ter capacidade de atrair os partidos para que seja implementado.?

O economista elogiou o segundo governo de Fernando Henrique Cardoso (de 1999 a 2002) e o primeiro mandato de Luís Inácio Lula da Silva (de 2003 a 2006) com relação a gestão macroeconômica. Segundo ele, o projeto econômico de um futuro governo da Rede Sustentabilidade não seria ?reinventar nada, mas voltar ao que estava dando certo?.