Pode haver má interpretação desta discussão para quem não domina conceitos de gestão do ciclo de vida dos contratos e está habituado a tratar a gestão dos contratos como uma atividade de auditoria, o processo de contratação como uma atividade de compra, e a habilitação de parceiros comerciais como uma atividade de habilitação jurídica. Aqui comento a terceirização segundo conceitos do Modelo GCVC (ou CLM utilizado no mercado americano). Portanto se algo ficar um pouco obscuro sugiro dar uma passadinha pelo site www.contratos.net.br.

No relacionamento que tive diretamente com mais de 100 profissionais de dezenas de empresas que fizeram cursos GCVC entre março do ano passado e fevereiro deste ano tive a oportunidade de aferir o progresso da terceirização destas empresas de diversos segmentos de mercado, inclusive hospitais.

Vamos começar lembrando que hospital é uma empresa que se diferencia bastante da maioria das outras quando falamos de contratos, porque costuma celebrar um grande número de contratos tanto com fornecedores (onde o hospital é contratante, por exemplo: fornecedores de medicamentos, materiais, OPME, serviços profissionais assistenciais, serviços profissionais não assistenciais, etc.) quanto com clientes (operadoras de planos de saúde, pacientes diretos, etc.).

Ao observarmos outras empresas, notamos que algumas têm muitos contratos com fornecedores e poucos com clientes (por exemplo: uma montadora de veículos que um número muito maior de fornecedores de peças e serviços do que concessionárias autorizadas que compram seus produtos), e outras têm poucos contratos com fornecedores e muitos contratos com clientes (por exemplo: um fabricante de software que costuma ter um pequeno volume de fornecedores comparado ao volume de distribuidores e clientes diretos em regime contínuo).

Hospitais são diferentes porque a proporção entre o volume de contratos com fornecedores e o volume de contratos com clientes é ?meio a meio? ? e estes volumes de contratos são elevados mesmo em hospitais de pequeno porte. Este fato já costuma definir uma característica marcante dos hospitais que é a de segregar as áreas de habilitação de parceiros comerciais, contratação e de apoio à gestão dos contratos, cada uma delas, em duas: uma que cuida dos contratos em que o hospital é a parte contratante, e outra que cuida dos contratos em que o hospital é a parte contratada.

Existe um viés nesta característica: nos hospitais onde a gestão do ciclo de vida dos contratos já está bem evoluída, a área de apoio à gestão dos contratos consegue, e bem, apoiar os gestores tanto nos contratos de aquisição como nos de fornecimento, uma vez que os controles administrativos são praticamente os mesmos, e o gestor do contrato tem as mesmas obrigações a cumprir independente de existir ou não uma área de apoio à gestão !

Análise da Terceirização da Habilitação de Parceiros Comerciais

Como a habilitação de parceiros comerciais trata de processos padronizados, e diga-se de passagem extremamente burocráticos, é difícil identificar alguma desvantagem junto aos hospitais que partiram para a terceirização, tanto dos fornecedores quanto dos clientes.

Mesmo para quem afirma que ?existem casos? em que o processo de habilitação ?deve afrouxar um pouco porque o parceiro comercial tem ligação política com a direção do hospital?. Este fato, criminoso em hospitais públicos, é mais comum do que se imagina nos hospitais privados. Principalmente em relação aos fornecedores: existem situações em que aquela empresa é indicada dentro de um contexto de negociação de outros negócios, ou de um vínculo familiar, ou outra questão subjetiva ? e sua habilitação vai ocorrer mesmo que não esteja 100 % dentro da norma.

A terceirização da habilitação não se inviabiliza nem mesmo nestes casos … basta definir o processo alternativo e, principalmente, as alçadas de enquadramento para o processo normal de habilitação, ou para enquadramento no, digamos assim, processo ?simplificado?.

Análise da Terceirização da Gestão da Contratação

Quando tratamos da gestão da contratação de fornecedores, a grande vantagem da terceirização é que invariavelmente o tempo de contratação cai, por diversas razões:

  • A especialização da empresa terceirizada nos processos relacionados aos certamos geralmente é maior;
  • O tempo de busca de proponentes geralmente é menor porque estas empresas costumam ter um cadastro item x fornecedor mais rico que o do hospital;
  • A empresa terceirizada geralmente tem ?braço? para se adequar às variações de demanda de contratação, enquanto a equipe interna geralmente é de tamanho fixo e sensível aos períodos de pico. Isso é muito importante ressaltar: a maior reclamação das áreas de negócio em relação à área de contratação de fornecedores é a de que existem períodos do ano em que ela não dá vazão à necessidade por ter uma estrutura fixa o ano todo.

A desvantagem da terceirização da gestão da contratação de fornecedores é o eventual vínculo dos fornecedores com a empresa terceirizada. Para minimizar este risco, a terceirização do processo de enquadramento das modalidades deve estar muito bem definida, e o de rodízio de fornecedores nos certames também. E é prudente uma rotina de auditoria por amostragem para aferição da adequação da empresa terceirizada aos interesses do hospital. No aspecto de contratação de fornecedores os hospitais públicos levam a vantagem, em relação aos privados, de ter os processos muito bem definidos (pelas leis), mas geralmente têm a desvantagem de não possuírem uma área de auditoria de processos compatível. Mas também devemos lembrar que ?faz bem para a saúde? independente de trabalharmos com empresas terceirizadas corruptas, ou com funcionários corruptos ? a necessidade é a mesma, embora o dano causado por um terceiro neste caso geralmente é bem maior.

Quando tratamos da gestão da contratação de clientes praticamente excluímos os hospitais públicos da conversa.

A principal vantagem da terceirização é o conhecimento que a empresa terceirizada tem do mercado, geralmente maior do que o que a área comercial do hospital possui. O início da negociação do hospital com a operadora é melhor pelo fato da empresa terceirizada já possuir um benchmark de mercado pronto, e desta forma identificar com maior clareza o quanto o hospital significa para a operadora e até onde ele pode ir nas negociações com segurança. É diferente negociar com a operadora com base no seu perfil de faturamento, ou com o conhecimento do perfil de faturamento de outros hospitais.

Evidentemente a empresa terceirizada não pode dizer que faz uso do conhecimento que tem dos demais hospitais, mas é mais evidente ainda que faça uso desta experiência para auxiliar seu cliente.

Outra vantagem é que a empresa terceirizada ?não está com a cabeça a prêmio? dependendo na negociação. Na verdade a ?cabeça da empresa já está a prêmio? a partir da contratação, porque a resistência a ela no hospital costuma ser grande em todos os níveis de gestão. Já o negociador interno mesmo quando não traz bons resultados nas negociações pode ter ?um padrinho? que o conserve por algum tempo no cargo ? não podemos nunca minimizar o aspecto político que conserva algumas pessoas em seus cargos na organização, não é verdade ?

A principal desvantagem da terceirização é o menor conhecimento que a empresa terceirizada tem do hospital, dos seus produtos atuais e dos que estão em desenvolvimento, e do histórico de problemas que o hospital tem com seus clientes da base. Sempre escutamos que ?nas masmorras do hospital? neste momento existe um ?médico louco? desenvolvendo algo novo que o mercado necessita, e ninguém sabe … se ninguém sabe dentro do hospital imaginem quem é de fora !

O resultado da minha interação com os gestores permite me deixar seguro para afirmar que os hospitais devem terceirizar ao máximo a gestão da contratação de fornecedores e mesclar, na gestão da contratação de clientes, uma equipe interna com uma empresa externa.

Análise da Terceirização da Gestão dos Contratos

Esta sem dúvida foi unanimidade para todos os que participam dos cursos e descrevem casos reais: só traz benefícios.

Considerando que:

  • Quando terceirizamos a gestão dos contratos tratamos dos eventos de controle administrativos e escriturais descritos no Modelo GCVC … apenas eles;
  • Terceirizamos apenas atividades de atribuição da área de apoio à gestão do contrato, e não das atividades de responsabilidade do gestor do contrato. Entre eles: medição, aferição de SLA, avaliação periódica do parceiro, etc.;
  • Mesmo empresas públicas estão amparadas por lei quando contratam empresas para apoio à gestão do contrato (descrito na mesma lei 8.666 que define o resto);
  • Os controles administrativos e escriturais são praticamente os mesmos tanto para os contratos com fornecedores, quanto para os contratos com clientes, e não influenciam diretamente no núcleo na relação comercial entre o hospital e o parceiro.

Então:

  • 1º É muito difícil justificar que existe necessidade de 2 áreas de apoio à gestão dos contratos: uma para contratos com fornecedores e outra para contratos com clientes … este paradigma já foi superado.
  • 2º Costuma ser mais difícil ainda justificar que uma estrutura interna possa executar estes controles com mais eficiência do que uma estrutura terceirizada especializada. Se a definição do que é necessário está feita, a estrutura externa especializada poderá fazer melhor, porque os aspectos administrativos da gestão dos contratos não fazem parte do ?core business? do hospital.

Considerações

É importante lembrar que quando se faz a comparação de terceirizar ou não é imprescindível avaliar o escopo completo das atividades. É comum ouvir que a estrutura externa acaba saindo mais caro, mas em todos os casos que analisei não estavam comparando ?banana com banana?.

Em resumo, a terceirização na gestão do ciclo de vida dos contratos já evoluiu bastante em hospitais, ainda tem muito para evoluir, e deixou de ser aposta. Já é uma realidade que tem trazido grandes benefícios aos hospitais públicos e privados que experimentaram em alguns de seus processos !